segunda-feira, 18 de abril de 2016

TODO MUNDO JÁ SABE: CARTA ABERTA A TRÊS PERSONAGENS DA REPÚBLICA

Imagem extraída do site oficial do PSTU www.pstu.org.br, 2016.

Texto de:  Agassiz Almeida Filho (na integra)

Senhores Aécio Neves, Eduardo Cunha e Michel Temer,
A data de hoje, 17 de abril de 2016, entrará para a história do Brasil como uma página de vergonha. Se a autorização para o impeachment da Presidente Dilma passar, estaremos perante um rompimento da Constituição por parte da Câmara dos Deputados. Se o pedido de abertura do processo de impeachment não for aprovado, restará uma tentativa de amplos setores da sociedade brasileira de romper a Constituição. Ambos os fatos são de extrema gravidade.
No início de 2015, a oposição atuou deliberadamente com o fim de desestabilizar o governo eleito, assumindo como plataforma as primeiras denúncias de corrupção na Petrobrás. Os desvios de conduta, o tráfico de influência, as ilegalidades de todas as ordens devem ser combatidas com dureza. Mas as primeiras manifestações refletiam claramente o descontentamento com o resultado eleitoral. E o senhor Aécio Neves capitaneou essa tendência, fortemente apoiado pelos mais relevantes setores da imprensa. No início de 2015, seus discursos de caráter desestabilizador eram amplamente veiculados pelo país afora. No Estado Democrático de Direito, senhor Aécio, não é assim que se faz oposição. Fiscalizar, cobrar e contribuir para a formação do consenso são comportamentos que não se confundem com a tentativa de desestabilizar um governo democraticamente eleito.
O Brasil acompanhou a contribuição do senhor e dos seus aliados para criar um ambiente no Congresso Nacional propício para a desestabilização da governabilidade. As pautas bombásticas, o discurso golpista, a formação de uma base parlamentar contrária a qualquer iniciativa do governo foram elementos indispensáveis para o aprofundamento da crise política e econômica. O senhor e os seus aliados também têm responsabilidade direta sobre as dificuldades econômicas que assolam o país. Tal comportamento é incompatível com a memória de Tancredo Neves.
É indispensável combater a corrupção sistêmica. E que todos os investigados e culpados cumpram a sua pena. Não quero acusá-lo da prática de quaisquer crimes, senhor Eduardo Cunha, pois não houve condenação e acredito no princípio da presunção de inocência como elemento basilar do sistema constitucional. Contudo, a falta de decoro parlamentar na sua atuação política é algo que salta aos olhos de qualquer pessoa minimamente informada. As manobras no Conselho de Ética da Câmara, o modo comprometido como conduz o processo de impeachment, as declarações cínicas na imprensa, tudo é prova de que o senhor não merece representar o povo brasileiro. E, naturalmente, jamais poderia estar à frente da Presidência da Câmara dos Deputados. Sua eleição para o cargo demonstra que a reforma política é muito mais do que urgente.
Aécio Neves e Eduardo Cunha são duas figurinhas que o Brasil já conhece. Aécio foi o candidato da oposição nas últimas eleições presidenciais. Os votos que recebeu não eram dele. Foram votos para o partido de oposição mais viável. Qualquer candidato do PSDB teria recebido quantidade semelhante de adesões. Não tem relevância nem liderança nacional. Quanto ao senhor Eduardo Cunha, não é preciso gastar nem mais uma letra para caracterizá-lo como o símbolo daquilo que a maioria dos brasileiros não quer para a Política. A grande surpresa para muitos veio da sua postura, senhor Michel Temer. O único dos três com alguma história para defender. Um professor de Direito Constitucional – constitucionalista nunca foi; não tem obras capazes de lhe conferir este título –, um nome tradicional do PMDB. O senhor nunca foi de assumir posições de coragem. Mas o que aconteceu desta vez?
Escreve uma carta para a Presidente Dilma e dá um jeito de ela ser conhecida pelo grande público, justamente durante os bastidores da formulação do impeachment. Todo mundo sabe que o senhor fez isso para justificar o injustificável: o seu rompimento com o governo com o objetivo de tramar contra a Presidente da República e assumir o cargo após um eventual impeachment (golpe).
A gravação revelada na última semana, onde o senhor fala como se estivesse no momento posterior à votação na Câmara dos Deputados, é uma vergonha. Todo mundo já sabe que houve um vazamento proposital da gravação, para tentar pavimentar o seu caminho para o Palácio do Planalto. O senhor nem merece o cargo de Professor nem de Vice-Presidente da República.
Ocorra o que ocorrer na votação da Câmara dos Deputados, na tarde de hoje, o senhor entra para os anais da democracia brasileira recente como um dos exemplos mais nefastos. Fico triste com isso. Tenho dois livros seus na minha biblioteca. Não são bons. Mas vou mantê-los, pois meus alunos de Direito Constitucional, no futuro próximo e remoto, vão querer saber o que escrevia um dos três personagens desse enredo perverso que o senhor vem capitaneando às escondidas nos últimos meses.
Pelas redes sociais, recebi uma mensagem que sugere a utilização do verbo “temerizar” como sinônimo de trair, enganar, agir sorrateiramente. Trata-se de um neologismo que passarei a utilizar a partir do meu próximo texto científico.
Agassiz Almeida Filho
Cidadão espantado com os rumos da política brasileira

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