quarta-feira, 3 de abril de 2024

Quando o Amor Vira Pó e Poesia Concreta

Por Belarmino Mariano.
Era uma daquelas matérias sensacionalistas que são destaque do Jornal do Cidade. Na capa e em letras garrafais, a reportagem destacava: "Mulher faz uma coluna de concreto para colocar as cinzas do amado falecido". Parece que nem a morte os separa.
O casal estava construindo sua segunda casa em uma das orlas de São Paulo, a casa de veraneio já estava bem adiantada na Ponta da Praia, um lote comprado no litoral santista com as economias da vida.
Depois da morte do marido e com as cinzas em um jarro funerário da família, Dona Eulália Matias Freitas resolveu homenagear o esposo instalando uma coluna de concreto na quina frontal da casa em construção. 
Diferente de outras pessoas que jogam as cinzas fúnebres ao mar, rio ou montanhas, que usam para regar as flores no jardim, ela quis fazer diferente.
Era uma casa rústica e a coluna ficou com 7 metros de altura por 1 metro de circunferência. O material escolhido foi o tijolo refratário rústico.
Dentro da estrutura mandou colocar um emaranhado de ferros grossos de 12 mm para sustentar o concreto e, em cada meio metro, quatro pontas dos vergalhões de 18 mm saem da coluna, cerca de 25 centímetros, sempre apontando para a exata direção dos pontos cardeais, colaterais e subcolaterais, dando uma imagem externa de radiais concêntricas.
Com o tempo, a oxidação criou uma camada de ferrugem que escorreu pela coluna como em uma chuva ácida registrada ao longo dos dias e noites, dizendo sem dizer, sobre a passagem natural das coisas.
Na altura dos 4,5 metros, ela deixou uma abertura no tijolo e colocou uma pequena cripta de vidro brindado com as cinzas do marido, sempre a vista.
Terminada a obra arquitetônica, aquela coluna era o destaque da casa e dava a ideia de uma coluna de um castelo abandonado ou boeira de forno, mas não existia a entrada ou saída para fumaça, pois era uma coluna preenchida por ferro e concreto.
A obra destoava das construções vizinhas e sempre gerava curiosidade para os transeuntes, pois alguém sempre sabia a história e comentava ser uma espécie de mausoléu ou túmulo fora do cemitério.
Muitos curiosos que não sabiam da história, sempre faziam fotografias e selfies no local. Essa construção imagética é um novo conceito para o ser humano e sua relação com a morte. 
Mas não é nada tão grandioso quando o Taj Mahal, o mausoléu que foi construído entre os anos de 1632 e 1653 pelo imperador Shah Jahan, em homenagem à sua falecida.
Com a sua aposentadoria, aquela segunda casa, virou a moradia permanente de Dona Eulália, ficando junto dos restos mortais do seu amado que já havia voltado ao pó. Ele era o pó que estava prisioneiro de um amor efêmero, porém concretamente eterno.
Por Belarmino Mariano. Imagens das redes sociais.

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