Fonte: Linha do tempo de Isidro Fortunato, set./2015 |
Incrível mesmo é você saber que a
sensibilidade, a mobilização da mídia mundial tem um padrão racial, Senegaleses
estão morrendo na costa do Mediterrâneo, estão sendo sepultado no fundo dos
mares, seus cadáveres são deixados para ser decompostos pelos sol e devorados
pelas condições climáticas existentes, no entanto precisávamos ser brancos, ter
a cor de Aylan Kurdin para que a morte fosse testemunhada pela media
internacional e todo mundo se comovesse. No entanto, a carne negra é barata
demais para tal, se a mídia internacional oferecer padrão de sensibilidade
pluri-racial para as tragédias humanas logo teriam de justificar todas as
atrocidades cometidas sobre pessoas negras, o descaso faz parte de um plano, é
necessário a carne e a vida negra continuarem baratas para que a opressão, as
guerras e as invasões, tenham justificação aos olhos do imperialismo
contemporâneo.
ENCONTROS ENTRE O PRESENTE E O PASSADO
Entre os mortos na praia e os escravizados - Rei Leopoldo e os crimes do colonialismo no Congo.
fonte: Rei Leopoldo e os crimes do colonialismo no Congo. |
Quando você mata dez milhões de
africanos, você não é chamado de “Hitler”
O
seguinte texto foi escrito por Liam O’Ceallaigh para a página Diary of a
Walking Butterfly, em dezembro de 2010.
Leopoldo
II foi Rei da Bélgica de 1865 a 1909, data de sua morte. Ele comandou o Congo
de 1885 a 1908, quando cedeu o controle do país ao parlamento belga, após
pressões internas e internacionais.
Olhe
para essa foto. Você sabe quem é?
A
maioria das pessoas não ouviu falar dele.
Mas
você deveria. Quando você vê seu rosto ou ouve seu nome, você deveria sentir um
enjoo no estômago assim como quando você lê sobre Mussolini ou Hitler, ou vê
uma de suas fotos. Sabe, ele matou mais de 10 milhões de pessoas no Congo.
Seu
nome é Rei Leopoldo II da Bélgica.
Ele
foi “dono” do Congo durante seu reinado como monarca constitucional da Bélgica.
Após várias tentativas coloniais frustradas na Ásia e na África, ele se
instalou no Congo. Ele o “comprou” e escravizou seu povo, transformando o país
inteiro em sua plantação pessoal com escravos. Ele disfarçou suas transacções
comerciais como medidas “filantrópicas” e “científicas” sob o nome da Associação
Internacional Africana. Ele usou o trabalho escravo para extrair recursos e
serviços congoleses. Seu reinado foi mantido através de campos de trabalho,
mutilações corporais, torturas, execuções e de seu próprio exército privado.
A
maioria de nós não é ensinada sobre ele na escola. Não ouvimos sobre ele na
média. Ele não é parte da narrativa de opressão repetida amplamente (que inclui
coisas como o Holocausto durante a Segunda Guerra Mundial). Ele é parte da
longa história de colonialismo, imperialismo, escravidão e genocídio na África
que se chocaria com a construção social da narrativa de supremacia branca em
nossas escolas. Isso não se encaixa bem nos currículos escolares em uma
sociedade capitalista. Fazer comentários fortemente racistas recebe (geralmente)
um olhar de reprovação na sociedade “educada”; mas não falar sobre genocídios
na África cometidos por monarcas capitalistas europeus está tudo bem.
Mark
Twain escreveu uma sátira sobre Leopoldo chamada “King Leopold’s Soliloquy; A
Defense of His Congo Rule” [Solilóquio do Rei Leopoldo; Uma defesa de seu mando
no Congo], onde ele ridiculariza a defesa do Rei sobre seu reinado de terror,
principalmente através das próprias palavras de Leopoldo. É uma leitura simples
de 49 páginas e Mark Twain é um autor popular nas escolas públicas americanas.
Mas como acontece com a maioria dos autores politizados, nós geralmente lemos
alguns de seus escritos menos políticos ou os lemos sem aprender por que é que
o autor os escreveu. A Revolução dos Bichos de Orwell, por exemplo, serve para
reforçar a propaganda anti-socialista americana de que sociedades igualitárias
estão fadadas a se tornar o seu oposto distópico. Mas Orwell era um
revolucionário anti-capitalista de outro tipo – um defensor da democracia
operária desde baixo – e isso nunca é lembrado.
Nós podemos ler sobre Huck Finn e Tom Sawyer, mas King Leopold’s Soliloquy não faz parte da lista de leituras. Isso não é por acidente. Listas de leitura são criadas por conselhos de educação para preparar estudantes a seguir ordens e suportar o tédio. Do ponto de vista do Departamento de Educação, os africanos não têm história.
Nós podemos ler sobre Huck Finn e Tom Sawyer, mas King Leopold’s Soliloquy não faz parte da lista de leituras. Isso não é por acidente. Listas de leitura são criadas por conselhos de educação para preparar estudantes a seguir ordens e suportar o tédio. Do ponto de vista do Departamento de Educação, os africanos não têm história.
Quando
aprendemos sobre a África, aprendemos sobre um Egipto caricatural, sobre a
epidemia de HIV (mas nunca suas causas), sobre os efeitos superficiais do
tráfico de escravos, e talvez sobre o apartheid sul-africano (cujos efeitos,
nos ensinam, há muito estão superados). Nós também vemos muitas fotos de
crianças famintas nos comerciais dos Missionários Cristãos, nós vemos safaris
em programas de animais, e vemos imagens de desertos em filmes. Mas nós não
aprendemos sobre a Grande Guerra Africana ou o reinado de terror de Leopoldo
durante do Genocídio Congolês. Tampouco aprendemos sobre o que os Estados
Unidos fizeram no Iraque e Afeganistão, matando milhões de pessoas através de
bombas, sanções, doença e fome. Números de mortos são importantes. Mas o
governo dos Estados Unidos não conta as pessoas afegãs, iraquianas ou
congolesas.
Embora
o Genocídio Congolês não esteja incluído na página “Genocídios da História” na
Wikipédia, ela ainda menciona o Congo. O que é hoje chamado de República
Democrática do Congo é listado em referência à Segunda Guerra do Congo (também
chamada de Guerra Mundial Africana e Grande Guerra da África), onde ambos os
lados do conflito regional caçaram o povo Bambenga – um grupo étnico local – e
os escravizaram e canibalizaram. Canibalismo e escravidão são males terríveis
que certamente devem entrar para a história, mas eu não pude deixar de pensar
sobre que interesses foram atendidos quando a única menção ao Congo na página
era em referência a incidentes regionais, onde uma pequena minoria das pessoas
na África estava comendo umas às outras (completamente desprovida das condições
que criaram o conflito, e das pessoas e instituições que são responsáveis por
essas condições). Histórias que sustentam a narrativa de supremacia branca,
sobre a inumanidade das pessoas na África, são permitidas a entrar nos registos
históricos. O homem branco que transformou o Congo em sua plantação pessoal,
campo de concentração e ministério cristão – matando de 10 a 15 milhões de
pessoas congolesas no processo – não entra na selecção.
Sabe,
quando você mata dez milhões de africanos, você não é chamado de “Hitler”. Isto
é, seu nome não passa a simbolizar a encarnação viva do mal. Seu nome e sua
imagem não produzem medo, ódio ou remorso. Não se fala sobre suas vítimas e seu
nome não é lembrado.
Leopoldo
foi apenas uma das milhares de coisas que ajudaram a construir a supremacia
branca, tanto como uma narrativa ideológica quanto como uma realidade material.
Eu não pretendo dizer que ele foi a fonte de todo o mal no Congo. Ele teve
generais, soldados rasos e gerentes que fizeram sua vontade e reforçaram suas
leis. Ele era a cabeça de um sistema. Mas isso não nega a necessidade de falar
sobre os indivíduos que são simbólicos do sistema. Mas nós nem mesmo chegamos a
isso. E como isso não é mencionado, o que o capitalismo fez à África e todo o
privilégio que as pessoas brancas ricas receberam do genocídio congolês
permanecem escondidos. As vítimas do imperialismo, como costuma acontecer, são
invizibilizadas.
Fonte:Muitoalémdocéu
(word Press)
FONTE:
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