quinta-feira, 10 de março de 2022

RETOMADA DA GEOPOLÍTICA OU GLOBALIZAÇÃO INTERROMPIDA?


Por: Belarmino Mariano*.

Nestas duas últimas semanas, o que vi de analistas políticos, historiadores e geopolíticos de plantão é de espantar. Já estou no mundo acadêmico faz uns 38 anos, dos quais, 28 giram em torno da universidade. Destes, em pelo menos 18 anos trabalho com estudos de Geografia Política e Geopolítica, sem contar com quase 12 anos lecionando no ensino médio e cursinhos pré-vestibular, especificamente sobre a geografia que tratava da velha ordem, da (des)ordem e da nova ordem geopolítica. Estes conhecimentos ficam entranhados em nossas cabeças, pois ao longo da vida acadêmica, lemos centenas de livros, artigos e revistas, jornais e portais de diferentes países. Participamos de encontros, congressos, simpósios, seminários e cursos de formação.

Nunca vou esquecer da abertura do XVII EREGENE em Feira de Santana, na Bahia em 1992, com palestra de abertura proferida por Milton Santos. Eu como membro da Executiva Nacional de Estudantes de Geografia, sendo o coordenador daquela mesa histórica em que o saudoso Milton Santos palestrou sobre “A NOVA ORDEM MUNDIAL”. Talvez daquela palestra tenha nascido o pequeno livro "Por uma outra globalização", publicado pela Record em 2001, pois é um livro claramente de opiniões, posições e apontamentos que se afastam do rigor científico formal, apesar de ser uma produção com conteúdos ao alcance de todos/as.

Confesso uma coisa para vocês, não é me gabando não, mas quem foi da geração 1970, 1980, 1990 e 2000, não apenas leu coisas sobre esses temas. A gente viveu na pele todas as tensões de uma guerra fria, todos os solavancos de uma Ditadura Militar no Brasil e em quase toda a América Latina, pois desse continente, escaparam basicamente as Guianas e o Suriname, que de fato nunca se tornaram independentes.

Agora ficar escutando uns “moleques” do jornalismo nacional e internacional, dando uma de entendidos, rasgando a história e encobrindo os fatos na nossa cara, não dá para ficarmos calados. Eu aprendi não por obrigação ou força, aprendi porque queria saber ao máximo sobre a ciência geográfica, sobre a geo-história, ciências sociais antropologia e política, com as quais sempre me identifiquei desde muito jovem.

Me tornei professor mesmo antes de concluir o curso, pois no mercado havia carência de professores, daí peguei um amor, uma paixão por essa profissão que já estou chegando perto de me aposentar, aprendendo, ensinando, aprendendo, pesquisando, me envolvendo com as questões políticas locais, nacionais e internacionais e sempre adotando os princípios e abordagens metodológicas que apontavam para o Materialismo Histórico e Dialético (Marx e Engels), em que não podemos escamotear a realidade, pois quem o faz, termina errando em sua análise, em especial em temas como o modo de produção capitalistas, suas contradições e crises de manutenção.


QUESTÕES PARA A GEOPOLÍTICA 

Feito este preambulo, vamos nos dirigir aos fatos com os quais estamos envolvidos, pelo menos nos últimos 30 anos, tempo suficiente para estruturação de uma ordem mínima das coisas. Mas antes de analisarmos esse realidade espaço-temporal, precisamos levantar algumas questões, pois sem elas nos atrapalharíamos no caminho e na escolha para a análise: 

A) O imperialismo capitalista capitaneado pelos Estados Unidos vive um declínio político e econômico, capaz de afundar essa ordem como ocorreu com o império romano da antiguidade? 

B) Será que a Rússia já superou a grande crise criada com a desintegração do Leste europeu e o fim da União Soviética (URSS), percebendo que em momento algum, o imperialismo capitalistas deu tréguas a Federação Russa?

C) A União Europeia suportaria os impactos de uma terceira Guerra Mundial dentro do seu território, caso os atuais conflitos se prolonguem, e como ficariam os grupos separatistas que ainda estão vivos nestes países? 

D) O que pensam os russos e chineses diante das velhas “armas geoeconômicas” norte-americanas (sanções e embargos ou bloqueios econômicos), contra seus mercados, que estão completamente integrados ao mundo globalizado? 

E) Qual será a situação da América Latina diante dessa crise política que envolve a velha OTAN, Ucrânia, Rússia e o resto do mundo, países de importância geoeconômica global, mais pouca influencia geopolítica? 

F) Será que a globalização desintegrou a velha URSS, mais criou os germes para acelerar um internacionalismo, com crises mais agudas no imperialismo capitalista, previstos por Marx & Engels, que Milton Santos escreveu em 2001, cantando a pedra para uma “Outra Globalização?


NEOLIBERALISMO E DESINTEGRAÇÃO SOVIÉTICA - O QUE AINDA SE ESCONDE NOS ESCOMBROS?

Poderíamos levantar dezenas de outras questões, mais esse pequeno artigo se tornaria quase infinito, o que, nos permite dizer, que as questões aqui, não serão respondidas a contento, mas apenas suscitadas para outras reflexões. Uma coisa é certa, muitas análises políticas sobre as décadas de 1980 e 1990, foram superficiais e revisionistas, em especial, aquelas que tentaram dar conta de analisar a queda rápida ou repentina de um gigante político (URSS), em meio a uma aguda crise do capitalismo imperialista americana e europeia, os obrigando a apelar para o esgarçamento das nações subdesenvolvidas, com o famigerado plano de neoliberalização da economia, com menos estado e mais iniciativa privada. Um plano do Fundo Monetário Internacional (FMI), endossado pelo Banco Mundial e pelas principais potências capitalistas da época.

Para que esse plano funcionasse, seria necessário ampliar a base de exploração e convencimento de outras nações, com isso fazer concessões para que países como a China, países asiáticos e países do Leste europeu, se interessassem pela possível renovação econômica do mundo. A propaganda do lado capitalista foi bem-feita e alguns grupos da Ex-URSS, também mostraram interesse pelo tema. Podemos dizer que a partir de 1985, as conversas já estavam adiantadas e até mesmo, acordos de desarmamentos entraram na mesa de negociação.

Muitos nem imaginam, mas os acordos para reunificar as “Alemanha Oriental e Ocidental” já estavam avançados desde 1986, devido aos encontros diplomáticos das superpotências, que culminou com a queda do Muro de Berlin em 1989 e, que passou para a história como um ato da população dos dois países, simbolizando os novos tempos do livre mercado.

Da reunificação da Alemanha, para a reabertura política no leste europeu, saída soviética do Afeganistão e gritos de independência das pequenas repúblicas bálticas (Letônia, Lituânia e Estônia). Chegamos em dezembro de 1991, com as ondas neoliberais varrendo Moscou, em um misto de golpe político dentro da Federação Russa e a rearticulação a partir do XX Congresso da URSS para discutir as mudanças que historicamente estavam em curso.

Ainda hoje nos perguntamos como que isso aconteceu tão rápido e tão intenso? Nem mesmo os mestres e os doutores em União Soviética e Rússia, ainda conseguiram responder a estas questões e talvez nem respondam, pois novos fatos reacendem novas perspectivas. Essa foi uma situação que merece muito estudo, muita análise, para além do que a grande mídia propagou como o fim do comunismo.

Uma coisa é certa, a EX-URSS se dissolveu ao final de 1991 e ao mesmo tempo em que se desintegrava, deu origem a uma nova organização geoeconômica aos moldes de vários blocos que se formaram ao longo dos anos de 1970 e 1980 em regiões influenciadas ou controladas pelo capitalismo norte-americano. Assim, nasceu do antigo bloco soviética a Comunidade dos Estados Independentes (CEI), com 15 das 18 ex-repúblicas que compunham a URSS, apenas os países bálticos não quiseram compor essa nova comunidade geoeconômica. Pareceu uma saída honrada para os mais de 73 anos de história de um poderoso bloco geopolítico que foi capaz de rivalizar milhares de situações conflituosas ao longo de 1917 (Revolução Russa) a 1991 (fim da União Soviética).

Lembro que no verão de 1991, escrevi um pequeno artigo sobre "Geo-história e Separatismo", para a série Fragmentos, do periódico Anarquista Edições Motim. Eram ensaios datilografados em estêncil a óleo e depois impressos em tiragens de no máximo 500 cópias. Começou com um pequeno alerta em que afirmava que o “mono é a destruição da diversidade dos organismos e que a humanidade está se construindo como uma grande monocultura planetária”. O leste europeu virou um caldeirão de revoltas em todas as direções, liberalismo e separatismo se misturavam em ondas nacionalistas, crises entre grupos étnicos e poder político para comandar os destinos de uma "nova ordem" que se apresentava.


ARMADILHAS DO NEOLIBERALISMO, DITADURAS E TIGRES ASIÁTICOS

Via que naqueles movimentos, estava se desenhando um momento em que ao invés de duas, apenas uma força política se tornaria hegemônica e mesmo que nacionalismos exacerbados e grupos separatistas fragmentassem seus territórios históricos, no geral o imperialismo capitalista, liderado pelos norte-americanos ganhava força, o que em curto prazo geraria muita tensão entre os blocos de países que começavam a se alinhar, muito mais geoeconomicamente, do que geopoliticamente.

Tudo parecia um furacão de velhas novidades e, estávamos no olho do furação, pois algumas ditaduras também começavam cair aqui na América Latina, fruto da forte crise econômica que o capitalismo da velha ordem não conseguia mais solucionar. Vale registrar que, com o fim das ditaduras militares em países subdesenvolvidos que eram controlados pelos americanos e europeus, foram engolidos pela nova onda neoliberal, com a eleição de governos que rapidamente passaram a privatizar empresas estatais a preços irrisórios e adotar políticas de instalação de governos em que os direitos sociais foram aviltados em quase todos os seguimentos, sendo comandado por empresas multinacionais e grupos econômicos estrangeiros.

Do outro lado do mundo, japoneses coreanos e chineses não fizeram movimentos bruscos, pois a presença militar norte-americana nessa área impediu mudanças geopolíticas significativas. As Coreia dividida não teve a mesma sorte da Alemanha unificada, mas a região recebeu uma forte injeção de dólares, fazendo surgir em pequenas nações um pujante capitalismo de novas tecnologias e de substituição de exportações: "Os Tigres ou Dragões Asiáticos", passaram a inundar o mundo com mercadorias que até então, só circulavam nos países desenvolvidos. Zonas Especiais de Livre Comercio da China, Japão, Coreia do Sul, Hong Kong, Taiwan, Filipinas e Indonésia eram o novo celeiro hi-tech do mundo capitalista.


Nestes 30 anos de neoliberalismo, os países subdesenvolvidos ficaram quase sem nada, pois governos entreguistas e corruptos solaparam o patrimônio estatal e soberania popular destes territórios, ao exemplo de países como México, Brasil, Argentina, Chile, África do Sul, países do Oriente Médio, Norte da África, Índia e Sudeste Asiático, todos foram depenados pelo FMI. Banco Mundial e transnacionais oligopolizadas pelo capitalismo central. Estatais do Petróleo, demais setores energéticos, recursos minerais e meios de comunicação, setores de ciência e tecnologia foram os principais alvos.

Uma das armadilhas do neoliberalismo e sua receita para os países subdesenvolvidos foram os diferentes níveis de endividamento externo destes países, os processos de dolarização das economias e as regras do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (BM), essa receita fez com que, estes países mergulhassem em profundas crises econômicas, sociais e políticas, os levando as aventuras de potenciais “salvadores da pátria” que defendia o estado mínimo para saírem das crises provocadas por quem propunha o neoliberalismo econômico e político. Esse modelo trouxe mais dependência financeira, econômica e tecnológica, pois as industrias nacionais não conseguiam competir com as gigantescas transnacionais.

Para os países do Leste europeu que estivessem querendo entrar na “Roda Gigante do Capitalismo”, bastava vender suas empresas estatais para a iniciativa privada multinacional, adotando governos “democráticos” neoliberais comprometidos com o mercado em todos os sentidos. Podemos dizer que houve uma verdadeira avalanche de países embarcando nessa nova onda, muitos enterram as bandeiras comunistas ou socialistas e os vários partidos que ainda guardavam alguma relação com essa ideologia eram hostilizados e, ou se modernizavam, mudavam de nome, mudavam de cores e de símbolos, ou simplesmente eram derrotados em eleições locais.

Pareceu algo mágico e encantado nessa grande onda de mudanças. Os mais radicais derrubaram estatuas de grandes lideranças e gritaram nas ruas que o comunismo e o socialismo haviam acabado, deixando órfãos centenas de partidos em centenas de países em todo o mundo. Esse fenômeno gerou uma espécie de cartasse e revisionismo político e as respostas não eram suficientes para entendermos essa nova realidade. Terapia coletiva, nova era, era de aquários, esoterismo e orientalismo foram muitos os caminhos da esquerda e, quem quis continuar na política, com raras exceções passou a defender um socialismo libertário, pois os muitos partidos comunistas e ou socialistas, mudaram de nome e de estatuto partidário ou foram reduzidos ao extremo.

Os grupos conservadores e os partidos da direita, também mudaram as suas vestimentas e se tornaram modernas forças neoliberais, transvestidas de sociais-democratas, democratas cristãos, liberais democratas etc. As velhas raposas da política passaram a surfar nas ondas do neoliberalismo e faziam as contas para negociar empresas estatais como excelentes negócios para a modernização do país e dos negócios particulares. Patrimônios territoriais e estatais foram vendidos ao preço de bananas e em menos de uma década, dinheiro das privatizações gasto e problemas socioeconômicos acumulados, as crises do neoliberalismo começaram a estourar em diferentes partes do mundo.


30 ANOS DE GLOBALIZAÇÃO - SERÁ QUE A BRINCADEIRA ACABOU?

Mas o mundo globalizado já se encontra em um outro patamar, redes sociais em alta, consumismo desenfreado, endividamento dos indivíduos em diferentes níveis, cartão de crédito, hipotecas, acesso a compra de bens duráveis em 50 ou cem meses. Investimentos em bolsas de valores, viagens internacionais e empregos em multinacionais eram sonhos aparente ao alcance de todos. Bastava um “pouquinho de esforço individual ou fé em Deus” e tudo era possível. Os programas de TV, a internet, os computadores domésticos e os telefones de bolso, encantaram as pessoas e como afirmou Milton Santos em 2001, o "mundo globalizado como em uma fábula", estava ao alcance de todos.

Nesse novo mudo global e interligado, trabalhadores, operários ou camponeses se transformaram em associados, colaboradores, agricultores familiares ou pequenos produtores rurais não eram mais camponeses e em um passe de mágica era como se não existisse mais luta de classes, nem antagonismos sociais, as desigualdades se transformaram em diferenças sociais, em que qualquer um poderia transcender com estudo e trabalho.

Nos países subdesenvolvidos o capital financeiro chegou ao campo, gerando uma agroindústria sem precedentes. O agronegócio se ampliou e milhões de trabalhadores rurais perderam seus empregos para as máquinas, suas moradias foram derrubadas para a expansão de grandes monoculturas, gerando desempregados e desabrigados do campo. Estes ampliaram as cidades gerando um caos urbano de submoradias em todas as direções, favelas, cortiços, palafitas, desempregados e subempregados se tornaram situações banais.

Nas universidades novos intelectuais davam conta de analisar diferentes possibilidades e aqueles ortodoxos de metodologias arcaicas que insistiam em papel e LP, estavam mofando em suas teorias fora de moda. O "fim da história" foi anunciado e a velha guarda virou memória ultrapassada. Imaginem como os debates ideológicos perderam o sentido, em especial quando as pessoas só estavam preparadas para as dicotomias (EUA x URSS), sem o exercício dialético de fato.

As vezes brinco com meus alunos, dizendo que sou daqueles que ficou entre os degraus da modernidade e a soleira da pós-modernidade, pois consegui absorver tanto as teorias socialistas e as libertárias e nesse interim, sempre desconfiei das bonanças do neoliberalismo. Na máxima em que a pobreza foi feita para os padres, poetas e comunistas, sempre achei que na verdade, a pobreza é o grande alimento dos capitalistas.

Hoje, depois de quase 30 anos de neoliberalismo, estamos sentindo o peso dessa cilada, com velhos discursos e velhas práticas que dão a tônica para uma nova crise dentro do sistema capitalista aparentemente hegemônico, mas profundamente fragmentado, que se utiliza de velhas práticas, de velhas políticas e ações para garantir o status cor do imperialismo capitalista central.

Na última década, comecei a desconfiar de discursos anticomunistas e antissocialistas como se ainda estivéssemos na velha ordem da Guerra Fria. Nas redes sociais, grupos crescentes defendiam posições claramente de extrema-direita, posições conservadoras e por incrível que pareça, estes grupos estavam sendo alimentados no submundo e nas garagens de forças obscuras preocupadas com o que eles passaram a chamar de perigo comunista, quando na verdade, se referiam aos avanços da China no cenário mundial. Qualquer país que no passado houvesse rivalizado com os Estados Unidos e que de alguma maneira estiveram ligados a EX-URSS, passaram a ser alvo desses grupos. 

Pobres dos cubanos que até então ainda não haviam embarcado nas ondas do neoliberalismo, os Norte-coreanos se tornaram alvo de constantes fake news, os venezuelanos que nunca estiveram do lado soviético da guerra fria, pelo simples fato de um governo mais nacionalista e patriótico foi logo tachado de comunista e aos velhos moldes da Guerra Fria, os EUA tentaram através de um golpe, destituir o governo em 2001.

Também vale registrar que as primeiras décadas do século XX foram significativas para que partidos populares de trabalhadores e de esquerda, assumissem o poder em vários países, exatamente com pautas antineoliberais e com projetos de valorização sociais das camadas populares. Estes governos frearam alguns aspectos das políticas privatizadores das décadas anteriores e alguns chegaram inclusive a estatizar e re-estatizar setores da economia, dando maior autonomia e soberania nacional. Isso incomodou estes grupos de extrema direita e tudo no discurso desse pessoal era identificado como comunismo.

No entorno da Rússia e da própria China, as ações da OTAN eram abertamente praticadas e começamos a perceber o estimulo aos movimentos separatistas e, com o discurso de combate ao terrorismo do Oriente Médio, os Estados Unidos e a OTAN entraram fortemente nessa região. Mas na macro estrutura ideológica do sistema, não se percebia o desenho de uma suposta nova guerra fria, pois com o combate aos supostos grupos terroristas, os norte-americanos invadiram dezenas de países na África e no oriente Médio.


FAZER GEOPOLÍTICA COM AÇÕES GEOECONÔMICAS

Ninguém parou para pensar que velhas práticas econômicas adotadas pelo capitalismo norte-americano como sanções, embargos ou bloqueios econômicos contra países que não lhe obedecem, também eram práticas de gregos e romanos, desde a antiguidade. Para os Estados Unidos, desde a velha ordem, passando pelas guerras mundiais e chegando a Guerra Fria, estas práticas econômicas e o apoio aos golpes militares e até mesmo a ocupação militar de países mais frágeis militarmente, deram a tônica de sua dominação mundial.

Mas parece que, o que parecia ter se consolidado enquanto neoliberalismo e globalização, tem escaramuças e fatos que não se explicam tão facilmente. Uma delas é observarmos que o mundo globalizado integrou ou fundiu países e economias de tal maneira que o interesse individual de uma das partes pode afetar profundamente as outras. O mundo se globalizou de tal maneira que velhas armas que funcionam contra pequenos países como Cuba, Nicarágua ou Venezuela, podem não funcionar contra outros como a China, Rússia ou Irã.

Mesmo que existam fortes choques culturais religiosos, territoriais e econômicos entre as nações e que as desigualdades sociais sejam camufladas pelos meios de comunicação de massas. Por outro lado, parece que a globalização, de alguma maneira acelerou o internacionalismo e a mundialização entre os povos, gerando empatia, solidariedade e necessidade de conhecermos em detalhas as outras culturas, países e continentes. Não digo que isso seja algum tipo de nova abordagem socialista ou comunista, longe de pensar nisso. O mundo globalizado, parece que incomoda até mesmo alguns países que estão no topo desse modelo.

Já é notório que, mesmo com uma forte pressão das grandes mídias e redes sociais, bombardear a opinião pública com contrainformação e repetição exaustiva de factoides ou cultura alienante, com programações idiotas e gostos culturais duvidosos, vemos que jovens e adultos mergulham cada vez mais profundo em movimentos e ideias que contrariam a base do sistema central. Para alguns analistas existe uma guerra de ideias e opiniões no seio das redes sociais, em alguns casos, existe muita manipulação e contrainformação, gerando uma nova militância do ciberespaço.

Nas redes sociais, mesmo que exista uma massa muito influenciada ao primeiro olhar, também é uma massa desconfiada e até certo ponto consciente que “algumas coisas estão fora da ordem, da tal nova ordem mundial”. Sem querer influenciar meus filhos de 21, 13 e 11 anos de idade, me surpreende as suas compreensões do mundo em que vivem, suas escolhas, suas opções. Vejo que suas mães também não usam do artifício do aparelhamento ideológico e essa molecada, responde muito criticamente em relação aos conceitos, preconceitos e atitudes perante esse mundo consumista e cheio de conteúdos vazios. Fico impressionados quando vão a minha estante de livros e separam coisas que li nos anos 80 ou 90... e leem e depois querem discutir, achar respostas que não ecoam mais em nossa realidade.

Aí eu começo a pensar que propaganda não muda realidade história, até influência, interfere, mais mudar mesmo não muda. A crise do imperialismo norte-americano, mesmo que tenham a maior estrutura militar do mundo, espalhada em mais 750 bases, em dezenas de países, inclusive com grande efetivo militar fora do seu território, talvez nem dará conta de lhe garantir a eterna hegemonia do mundo, cada vez mais globalizado e nem mesmo poderá lhe proteger dos reverses da história de fato. 

Mas não é só isso, a crise do imperialismo capitalista não é apenas norte-americana e dos seus sucessivos governos de extrema direita (com ares democratas ou republicanos), conservadores e militaristas, começar a sentir as ameaças reais, vidas de países que sempre foram ameaçados pelo seu poderio bélico, era uma coisa distante uns 30 anos, maquilagens da guerra fria. Nos últimos anos, quando liamos conflitos era sempre com preocupações mercadológicas, guerras comerciais ou algo parecido. Isolar um país, embargar outro, taxar determinadas mercadorias, como as disputas entre EUA e China, sempre nos situávamos em leituras geoeconômicas globais. 

Algumas práticas dos Estados Unidos contra pequenos países como Cuba funcionavam e ainda continuam. A pequena ilha já vive sob o embargo econômico norte-americano desde 1950, ou seja, aos 72 de sua revolução, os cubanos liderados por Fidel Castro, nunca se dobraram a grande potência geopolítica que lidera o imperialismo capitalista há quase um século. 

Agora imaginem isso com países como a China, que foi arrasado pelo imperialismo britânico e francês, que foi invadida e arrasada pelo imperialismo japoneses, que passou por dezenas de guerras anticoloniais e pela Revolução Socialista liderado por Mao Tsé-tung também na década de 1950, também sofreu fortes embargos dos EUA. A China, apesar de gigante era um país extremamente pobre e destruído pelas guerras, mas que ao longo dos últimos 50 anos se tornou a segunda maior potência econômica do mundo e a primeira em vários setores.


NOVA GUERRA FRIA OU CONFLITOS GEOECONÔMICOS CAPITALISTAS COM IMPASSES MILITARES E TERRITORIAIS?

Imaginem os Estados Unidos em crise política e econômicas querendo provocar a Federação Russa, um país com a maior capacidade bélica do planeta, herdada da Ex-União Soviética. Mesmo não sendo a maior ou uma das dez maiores economias do mundo, possui um dos maiores potenciais energéticos e minerais do Planeta, tendo ao seu redor uma forte coesão política de vizinhos que congregam a CEI, desde 1992 e que continuaram no raio direto de influência política, econômica e cultural com a Rússia, além de sua ampliação de forte influência econômica com a União Europeia que depende em até 40% do mercado russo de gás e petróleo aos preços que chegam a serem inferiores em até 45% dos preços praticados pelas grandes empresas americanas, que também aproveitam os preços baixos para comprar os produtos russos.

Aqui não estou querendo entrar no mérito que o mundo viva uma guerra em diferentes aspectos, entre os quais se destaca a economia, o ciberespaço, as tecnologias e os enfrentamentos militares. Apesar de tensões e operações militares no leste europeu mais especificamente entre a fronteira russo-ucraniana, gerados e que já se arrastam em pelo menos oito (08) com golpe político na Ucrânia, anexação da Crimeia a Rússia e massacre de minorias russas pelo governo da Ucrânia, em território que o governo russo acabou de reconhecer como áreas separatistas (Donetsk e Luhansk), que se tornaram independentes e pediram para se integrarem a Federação Russa e foram reconhecidas.

Esse conflito pontual ou regional que já dura quase uma década, nada mais é do que uma acomodação geoestratégica de forças geopolíticas em disputas geoeconômicas, muito mais provocadas pela própria situação de crise econômica do imperialismo capitalista, do que as propagandas do imperialismo tenta lançar pelas suas mídias e redes sociais.

Isso ocorre da mesma maneira que essa grande mídia tenta esconder as dezenas de outros conflitos provocados pelos próprios norte-americanos em continentes como África, Oriente Médio, Ásia e América Latina, conflitos que já geraram nas últimas duas décadas, mais de 26 milhões de refugiados. Intervenções militares, invasões e ocupações, que sempre contaram com o apoio da OTAN ou de aliados que são controlados pelos interesses do imperialismo americano. Os lucros e as vantagens econômicas dessas ações militares sempre justificam os altos riscos militares, pois o mercado de armas e de guerras é muito lucrativo.

Alguns desses conflitos, serviram de propaganda do poderio imperialista ao exemplo do apoio norte-americano ao Estado artificial de Israel, contra palestinos e outros países de fronteira, além da invasão do Iraque e do Afeganistão e das constantes pressões geopolíticas contra Irã e Paquistão. A tentativa frustrada de invasão da Síria, que além de encontrar forte resistência teve o decisivo apoio do governo russo. A inexplicável e estabanada saída do Afeganistão, país que foi berço de forte pressão dos Estados Unidos, durante a Guerra Fria contra a URSS na região da Ásia Central, Cáucaso e Oriente Médio.

Muitos ainda não compreenderam a saída estabanada das tropas americanas, inglesas e francesas do Afeganistão no ano de 2021. O Talibã, foi um movimento criado pelos Estados Unidos, contra o Socialismo que estava sendo implantado no Afeganistão com o Partido Democrático do Povo do Afeganistão (SAUR, 1978). 
Esse movimento Saur  havia provocado uma revolução política, cultural e econômica no Afeganistão. Tanto para homens quanto para as mulheres. Educação, saúde, desenvolvimento socioeconômico e respeito as diferenças. 
Com a implantação do Socialismo, as mulheres passaram a ter direito a escola e começaram a viver a liberdade, inclusive compondo o Exercito de Libertação do país e assumindo funções políticas e de comando. Muitos não sabem, mas em plena Guerra Fria, os Estados Unidos, a partir do Paquistão, passaram a recrutar crianças e jovens afegãs em campos de refugiados para treinamentos militares, para o combate contra os socialistas afegãos que tinham apoio soviético.

O Talibã nasceu assim, constituiu-se de crianças e jovens e lhes foi oferecido treinamento militar, enquanto chefes religiosos sunitas ou islâmicos aos moldes árabes lhes deram uma base religiosa fundamentalista, com a história da guerra santa e das 200 mulheres nos jardins de Alá, para quem morresse lutando contra o inimigo. O fundamentalismo árabe veio com Osama Bin Laden e outros lideres religiosos tribais que, depois de quase uma década lutando contra os socialistas afegãos e os soviéticos, estes se retiraram em 1989, enquanto o país foi tomado por uma guerra civil entre os próprios afegãos, pela disputa do poder nacional. 

Nessa luta, bem armados pelos americanos, os talibãs assumiram o poder. Então juntaram as armas capitalistas e o fundamentalismo islâmico passaram a destruir os direitos sociais  construídos em décadas anteriores. Dissolveram o parlamento, o poder judiciário, acabaram com os sistemas cooperativos de produção e proibiram as mulheres de estudarem, além de matarem todos os potenciais inimigos no novo regime. 
A partir de 2001, com o discurso de combate ao terrorismo que destruiu as torres gêmeas americanas, os Estados Unidos invadiram o Afeganistão em confronto direto com os talibãs. De 2001 a 2021 já eram 20 anos de invasão americana ao Afeganistão. Corrupção, roubo do petróleo, contrabando americano de papoula, ópio e outras riquezas. Também existe uma desconfiança internacional de outros interesses americanos na ocupação da região, entre elas o desenrolar da "primavera árabe" e a Guerra na Síria a partir de 2011. Ainda não temos uma explicação plausível para a saída ou abandono desse território pelos americanos, que passaram a embargar o Afeganistão que passou as mãos do Talibã mais uma vez. A saída apressada, tem provocado uma situação trágica, pois analistas dão conta que, seriam massacrados pelo Talibã e os outros grupos nacionalistas afegãos, situação semelhante ao que ocorreu no Vietnã entre 1955 e 1975.


VELHAS PRÁTICAS INTERNACIONAIS DA NOVA ORDEM NOS CONFUNDEM DEMAIS COM A GUERRA FRIA DE OUTRORA

Acompanhado todos estes conflitos da chamada Nova Ordem Mundial, ficamos pensando sobre o longo período em que se estendeu a chamada “Velha Ordem Geopolítica Internacional”. Sabemos que existe um consenso em que a “Velha Ordem Internacional” se estendeu da Revolução Industrial (meados do século XVIII) até o final da Guerra Fria (1992). Mesmo que estes momentos sejam profundamente distintos, ambos apresentam elementos estruturais de ordem geopolítica e geoeconômica mundial que permite aos historiadores, sociólogos, geógrafos, economistas e cientistas políticos, uma leitura integrada.

Um dos fios condutores das análises é a consolidação do imperialismo capitalista europeu e norte-americano (entre a primeira e segunda revolução industrial) e as guerras de disputas pelo controle colonial, em especial na África, Ásia e Oceania, além das disputas imperais na Europa do século XIX (britânicos, francos, prussianos, austro-húngaros, russos e turco-otomanos), até chegarmos ao século XX, com a 1ª Guerra Mundial, Revolução Russa e formação da URSS, ascensão do nazismo, fascismo e a 2ª Guerra Mundial.

A Guerra Fria que começou por volta de 1947 e se estendeu até 1992 foi um desdobramento da 2ª GM, com uma nítida disputa política, econômica e ideológica entre as duas potencias que emergiram ao final da 2ª GM, Estados Unidos e União Soviética, que mesmo tendo sido aliadas durante a guerra contra nazistas, fascistas e o império japonês de Hirohito I, depois do conflito tomaram caminhos opostos e foram responsáveis diretos pela Guerra Fria.

Ao final da 2ª Guerra, com os ataques atômicos americanos a Hiroshima e Nagasaki, além da ocupação militar dos EUA ao Japão e pelas disputas político territoriais dentro da Alemanha que foi dividida em quatro zonas de controle russo (oriental), britânica, francesa e americano (parte ocidental), os interesses opostos das duas potências geopolíticas foram aumentando até que as hostilidades geraram um completo afastamento, isolamento e bloqueios econômicos, militares, sociais, culturais e políticos que duraram até 1991.

A Guerra Fria, apesar que não ser marcada por um longo período histórico, foi muito intensa do ponto de vista geopolítico e geoestratégico, bem como por grandes ações revolucionárias e adesão de países tanto ao bloco soviético quanto americano. Também foi um longo período de instalação de ditaduras militares, tanto do lado soviético, quanto do lado americano, bem como, de movimentos de independência ao exemplo da Revolução chinesa, cubana, angolana, entre tantas outras que se tornaram países independentes ou ditaduras militares aliadas de uma das duas potências geopolíticas.

No começo de 1949 a 1955 as duas potências já haviam criado duas organizações geoestratégicas com poderio militar ao exemplo da OTAN (Organização Tratado do Atlântico Norte (1949) constituída pelos Estados Unidos Canadá e os dez maiores países da Europa Ocidental) e do lado soviético a formação do Organização do Tratado de Varsóvia (OTV, 1955) ou Pacto de Varsóvia, que tinha a mesma função de defesa e proteção militar dos seus aliados do Leste europeu e da URSS, contra as potências aliados dos norte-americanos.

Além dessas duas organizações, passamos a ter uma forte corrida armamentista e de tecnologias aeroespaciais e de informação, tecnologia e inteligência monitoradas por grupos secretos que atuavam entre as duas potencias com espionagem, roubo de tecnologias e conhecimentos científicos além de cientistas das duas potências ou de países aliados que eram atraídos para o poder central das duas potências bélicas. Também foi uma época de grandes conflitos regionais, ao exemplo da guerra da Coreia (1950-1953), que culminou com a divisão do país entre Coreia do Norte, sob influência russa e Coreia do Sul sob influência norte-americana.

Outro grande conflito em que os norte-americanos se lançaram, foi a invasão do Vietnã (1955-1975), conflito que chegou a dividir o país em dois, mas que os vietnamitas do Norte, não reconheceram e continuaram na luta até a expulsão dos norte-americanos dos seus territórios. Esse conflito arrastou quase todos os países do sudeste asiático para dentro da guerra mais violenta da região e mais duradoura do período da Guerra Fria.


FIM DA GUERRA FRIA, SEPARATISMO OU O COMEÇO PARA NOVAS GUERRAS?

O período da Guerra Fria (1947-1991) foi marcados por conflitos regionais que ocorreram no extremo oriente, sudeste asiático, Oriente Médio, países africanos e na América Latina, principalmente para combater ditaduras militares financiadas e mantidas pelos governos dos Estados Unidos. Além de algumas ditaduras mantidas pelos soviéticos. Apesar da falsa ideia de que as grandes potências não se enfrentaram diretamente, não significa dizer que os grandes conflitos vividos em todas estas regiões, tenham sido de menor importância, pois milhões de pessoas morreram nestas guerras e ainda existem sequelas até os dias atuais, como a manutenção e expansão da OTAN de 12 para 30 países, a manutenção da divisão político-territorial da Coreia e a tensão constante entre a China Continental e a China Insular (Taiwan).

Recentemente observamos que também se criou uma falsa ideia de que com o fim da Guerra Fria (1992) os conflitos armados foram praticamente encerrados. Mas isso não foi verdade, pois tanto as guerras separatistas da Europa, como as guerras na África e no Oriente Médio, até se intensificaram. Os movimentos separatistas que dividiram países no Leste Europeu acirraram velhos conflitos separatistas na África e até mesmo na Europa Ocidental.

No Leste europeu o caso mais conflitante foi a região da ex-Iugoslávia. Com violentos conflitos, em especial entre 1991 e 1997 que se estenderam até 2006, quando ao final destes conflitos, o país havia mergulhado na maior fragmentação territorial da geopolítica recente, deixando um saldo de formação de oito novos territórios, entre os quais: Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegovina, Servia/Iugoslávia, Macedônia, Montenegro, além dos territórios de Kosovo e Voivodina, ainda em litígio.

Em se tratando dos conflitos entre os iugoslavos, esse foi o primeiro grande conflito pós-guerra fria, que teve o direto envolvimento dos Estados Unidos e da OTAN, sem que a ONU tivesse feito algum tipo de análise da situação e que só depois, sob a pressão norte-americana cedeu ao discurso pró-imperialista, que já havia provocado todo o tipo de desastres humanos na região dos Balcãs.

Claro que a Iugoslávia era um território identificado como de maioria eslava, marcada por diferentes tribos desde a antiguidade, tendo ficado isolada dos Eslavos do Norte e Leste (Rússia, Bielorrússia e Ucrânia), além dos eslovacos, poloneses, búlgaros, tchecos, cossacos e outras etnias eslavas. A palavra Iugoslávia significando Eslavos do Sul.

Na verdade, esse território dos Balcãs, sempre esteve no meio do caminho entre os grandes impérios que foram se formando desde a antiguidade, como domínios dos greco-romanos, turco-otomanos e austro-húngaros que submeteram os eslavos do Sul aos seus interesses políticos, econômicos e cultural religiosos, tornando estes territórios de maioria eslava, mas com adoções religiosas distintas como cristãos ortodoxos, católicos apostólicos, islâmicos e judeus, gerando um caldeirão de tensões étnicas e culturais ao longo da história humana nos Balcãs.

A unificação dos eslavos do Sul que deu origem a Iugoslávia sempre esteve no cerne das questões geopolíticas territoriais que só foram possíveis depois da 1ª Guerra Mundial, pois entre os séculos XVIII e XIX essa região foi território de constantes disputas, controle perdas, entre ortodoxos, mulçumanos, turco-otomanos, austro-húngaros, gregos, albaneses e italianos. Ao final da década de 1920, por volta de 1929 os eslavos do Sul constituíram o Reino de Sérvia Croácia e Eslovênia. Durante a 2ªGM, foi invadido em 1941 pelos alemães e italianos, gerando um verdadeiro massacre nazifascista na região, submetendo esse povo e território aos interesses de Hitler.

A predominância da etnia eslava e a consolidação da União Soviética liderada pelos russos, criou as condições para a progressiva unificação territorial e quando foram libertados dos nazifascistas, ao final da 2ª Guerra Mundial, foi dissolvido o reino e instalada a República Popular Federativa da Iugoslávia. A República se manteve unida até 1991 e, com a desintegração da URSS o país viveu sua pior e mais sangrenta disputa, com interferência direta da OTAN. Essa onda separatista que em menos de uma década fragmentou o território em oito países e dois territórios ainda em litígio, ainda choca analistas internacionais.

Foi de fato o primeiro grande conflito armado pós guerra fria, com o envolvimento de tropas internacionais, massacres, genocídios ou “limpeza étnica” só vistos durante o nazi fascismo da 2ª GM. Os debates entre nacionalistas e separatistas acirrou as tensões em toda a Europa, do Reino Unido como os radicais do Exercito de Libertação da Irlanda, passando pelos separatistas bascos no Norte da Espanha e catalães no Sul da Espanha, além de movimentos separatistas na Itália com dezenas de grupos étnicos, partindo de Nápoles, Veneza, Lombardia, Sardenha e Sicília, entre tantos outros grupos extremistas que defendem a saída da Itália por não se sentirem italianos, ou se sentirem discriminados etnicamente.

Uma nova guerra ou conflitos de proporções regionais, dentro da Europa poderão sacudir mais uma vez os movimentos separatistas no Reino Unido, Espanha, Itália e outros países do continente. Algo parecido com o que acontece desde 2014 dentro da Ucrânia com a independência da Crimeia e a anexação a Federação russa, além da região leste de Donatsk e Luhansk. bem como, de dezenas de outros conflitos separatistas dentro do próprio território russo.

Outras regiões com fortes movimentos separatistas são encontradas no Oriente Médio, com os Curdos e na Ásia Central, Cáucaso (entre o Mar Negro e o Mar Cáspio), envolvendo separatistas nas fronteiras com a Rússia, Georgia, Azerbaijão e muitos outros países dessa região. Minorias étnicas e o sonho de um território independentes, além de enclaves étnicos entre estes países geram constantes conflitos, inclusive com disputas armadas e conflitos sangrentos.

Aqui ainda podemos falar que conflitos entre Paquistão e Índia (região da Cachemira), China e suas regiões autônomas da Mongólia Interior, Sin-kiang, Tibet, Guangxi e Ningxia, além de Taiwan que em década se considera separada da China continental, fato que não é reconhecido pela grande China, mas os Estados Unidos e a OTAN desejam que essa situação de independência se concretize. Além de Hong-Kong que também deseja se emancipar da China, com pressões externas dos ingleses, americanos e franceses.

Mas a ideia é apenas relembrar aos leitores que, com a derrubada do Muro de Berlin e a reunificação da Alemanha, o mundo por incrível que pareça passou a viver situações inversas e a aparente hegemonia norte-americana fez com que os Estados Unidos intensificassem ainda mais geoestratégias expansionistas e militaristas em todo o mundo, com muito mais força política e econômica submissas ao poder militar norte-americano do que antes da guerra fria.

Em vários países, os americanos trocaram a velha política das ditaduras por governos neoliberais, claramente interferindo em eleições, através dos meios de comunicação de massa e de financiamentos aos políticos que estavam dentro da sua linha de interesse multinacional e transnacional. Notadamente em países  com potencial energético e mineral. Quando não consegue o controle político pela via da "democracia burguesa", intervém economicamente com embargos, ou militarmente, promovendo ataques, invasões, sempre com desculpas de ameaças nucleares, armas químicas, terrorismo etc.


UMA NOVA ORDEM  GEOECONOMICA COM BELIGERÂNCIA GEOPOLÍTCA

Os Estados Unidos ampliaram suas bases militares em todos o mundo, fortalecendo principalmente o Mar do Japão para continuar controlando o Japão, Coreia do Sul, Taiwan e Filipinas, no Oriente Médio com maiores bases em Israel e Arábia Saudita, inclusive com bases nucleares em Israel e no Leste Europeu, com forte presença militar na Alemanha, Itália e vários países do antigo bloco soviético nessa região do Leste europeu.

Também observamos que, apesar de o Tratado do Pacto de Varsóvia ter sido dissolvido junto com a desintegração da URSS (1991), a OTAN continuou se expandindo, tendo pulado ao longo dos últimos 30 anos de 12 países aliados para 30, sendo a Europa ocidental e oriental, os territórios com o maior número de membros da OTAN (Mapa de expansão Militar dos EUA):

 

Mapa de bases militares dos Estados Unidos fora do seu território nacional

Fonte: Natalia Sayuri Lara/Maria Clara Rossini/Superinteressante (17/11/2021). https://super.abril.com.br/coluna/oraculo/quantas-bases-militares-os-estados-unidos-tem-fora-de-seu-territorio/

Esse mapa de 2021 deu conta que são mais de 750 bases militares americanas no mundo, 119 destas bases em terra e mar estão no Japão desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O Japão é um país refém das forças armadas americanas, com Exército, Marinha e Aeronáutica. Hoje, são mais de 45 mil militares americanos dentro do Japão. Será que os países devam ser submissos aos interesses geopolíticos americanos? 

Faz 77 anos que as forças militares Norte-americanas estão estacionadas em territórios japoneses, uma espécie de humilhação e retaliação ao povo japonês que lutou contra os americanos durante a 2ª Guerra Mundial, período em que os EUA, lançaram duas bombas atômicas contra as cidades de Hiroshima e Nagasaki, quando as forças de Hihorito I já estavam rendidas. Os Estados Unidos também impedem que os japoneses desenvolvam forças militares e arsenal bélico de defesa. Os japoneses vivem uma paz forçada e artificial, com seu maior inimigo e agressor vivendo dentro da sua própria casa.

Na mesma região os EUA mantêm 15 bases militares e quase 30 mil militares dentro da Coreia do Sul. Somando esse contingente armado entre Japão e Coreia do Sul, são mais de 130 bases militares e cerca de 75 mil soldados Norte-americanos entre o Japão e a Coreia, fronteiras com a China, Rússia e Coreia do Norte. Esse gigantesco poder militar Norte-americano no Mar do Japão é maior do o que o de dezenas de países países em todo o mundo.

Desde o século XIX, os americanos adotaram uma ideologia e estratégia chamada de "Doutrina Manifesto", na qual acreditam que seja vontade de Deus que os Norte-americanos dominem o mundo. Vejam que na América Latina, são quase todos os países com bases militares instaladas e os que não têm, como é o caso de Venezuela, Cuba ou Brasil e Argentina, sofrem forte pressão militar dos EUA.

No continente africano a região Norte do continente por possuir a maior concentração de petróleo e ser o local em que as grandes multinacionais americanas do petróleo, são territórios com o maior número de bases militares, fechando o cerco com as bases do Oriente Médio, entre o Mar Negro, Mediterrâneo e Mar Vermelho.

Depois da dissolução da URSS, os americanos passaram a acreditar que o mundo se tornou unipolar, e mesmo com o neoliberalismo e a globalização, continuam acreditando que mandam militarmente no mundo. Hoje, pelo menos dez países dominam ou possuem armas nucleares, inclusive com os russos tendo mais ogivas nucleares que os americanos. Esse conflito na Ucrânia, estimulado e provocado pelas forças da OTAN, já dura 8 anos, mas agora, poderá se tornar em algo fora do controle, jogando o mundo no campo das incertezas e imprevistos, pois não mais apenas as guerras convencionais e, com mundo completamente integrado economicamente, com um meio informacional muito desenvolvido e 30 anos de avanços tecnológicos e bélicos, passamos a viver a incerteza e imprevisível na prática (Quadro de potencial nuclear no mundo):


Esse poderoso arsenal bélico nuclear disparado ao mesmo tempo, poderá destruir a Terra e afetar o Sistema Solar. Dito isso, sentimos que o homo sapiens nos levou para um caminho sem voltas. Isso se prevalecer a insensatez humana. 

Quando vemos as estratégias geoeconômicas como armas da guerra, começamos a achar que os planos da OTAN estão dando certo. Os irmãos Ucrânia e Rússia se matam, enfraquecem e favorecem as operações do imperialismo norte-americano na região. Enquanto alimentam a guerra, usam o sínico discurso da democracia, pacifismo e segurança mundial. A guerra cibernética, a guerra das sanções o uso das mídias e redes sociais para construírem um discurso de bem e de mal aos moldes da guerra fria, nos coloca diante dos riscos e incertezas são muito grandes.

A Otan já alimenta militarmente as forças golpistas ucranianas em pelo menos oito anos. Ameaça os países europeus para o envio de armas para o território ucraniano, portanto contribuem para o acirramento do conflito e aumentam as incertezas da paz artificial que apenas discursam em suas estruturas de poder e até mesmo em reuniões da ONU. Os Europeus sentiram na pele o que Putin alertava. "A Otan estava levando a Europa para uma guerra sem precedentes". E a arma das sanções econômicas contra a Rússia, atingem de cheio a União Europeia e caso o conflito se estenda, os impactos das sanções prejudicarão profundamente o Euro e a própria estabilidade econômica de toda a Europa.

Pesquisas indicam que as primeiras sanções econômicas foram adotadas pelos gregos desde o século V a.C. Em nada mudou essa ideia. Hoje quando um país quer confrontar ou isolar outro, utiliza essa tática como forma de isolar o país inimigo, com o bloqueio econômico, financeiro e comercial, impedindo que a nação bloqueada não consiga desenvolver suas atividades nem relações manter relações econômicas com outras nações.

Ao longo das guerras dos séculos XIX e XX, todos os países da Europa adotaram sanções econômicas contra seus adversários, ao Exemplo do Reio Unido, França, Alemanha etc. Os Estados Unidos da América do Norte é o país que no último século e neste, mais se utiliza desse expediente, que durante a Guerra Fria se tornou uma das estratégias de isolar os países do Bloco Soviético.

A Rússia, juntamente com os demais países da União Soviética viveram sob embargo econômico do ocidente por 70 anos (1922 a 1992)? Se tem um país que aguenta, bloqueio econômico e chantagem capitalista, chama-se Rússia, quando fazia parte da União Soviética.

Os Norte-americanos lançaram sanções econômicas contra o Iraque, Afeganistão, China, Irã, Líbia, Síria, Cuba, Nicarágua, El Salvador, Venezuela e muitos outros. Mas uma coisa muito importante a ser dita em tempos de neoliberalismo e globalização: qualquer sanção econômica, por mais lógica que pareça, sempre será uma ação com efeitos contrários, que atingem diretamente quem praticou o embargo, afetando também os demais parceiros econômicos.

Nessa nova fase da globalização e do neoliberalismo, há pelo menos dez anos que os Estados Unidos declaram guerra comercial a China, por incrível que pareça, os chineses responderam com a "mesma moeda" e os efeitos negativos ou positivos atingiram não apenas os dois, mais a economia global como um todo.

Para completar, a China e Rússia acabaram de assinar um acordo de amizade sem limites e sozinhos, conseguem se manter apenas com seu mercado interno por séculos ininterruptos. Também é importante relembrar que existem um grande bloco de interesses econômicos que envolvem Brasil, Rússia, Índia; China e África do Sul (BRICS), logo, a depender do desenrolar do conflito Rússia x Ucrânia x OTAN, poderemos ter situações incomodas em relação aos embargos econômicos que os Estados Unidos e alguns países europeus estão lançando contra os russos.

Será que os Estados Unidos, com suas sanções econômicas, conseguirão concorrer com os preços e capacidade produtiva dos chineses, russos e seus parceiros? Será que a criação dessa atmosfera de uma nova guerra fria, patrocinada pela OTAN e EUA vai levá-los para um novo patamar de liderança mundial ou colocará em xeque a própria viabilidade de um mundo globalizado?

Ao listarmos os 7 principais erros dos Estados Unidos em provocarem essa situação de conflito russo/ucraniano, colocaram todo o mundo em alerta que as incertezas de uma guerra, poderão levar o mundo para uma espécie de "lugar nenhum", e diante de potências nucleares, podemos pensar que a humanidade poderá deixar de existir. Entre as dezenas de erros elegemos  o jogo dos 7 erros:

1º Expandir a velha OTAN para as fronteiras com a Rússia ou para o Leste europeu, descumprindo acordos do pós Guerra Fria e da dissolução do Pacto de Varsóvia. Esse é o principal argumento russo para justificar os conflitos nas suas fronteiras, ao exemplo da Geórgia e da Ucrânia;

2º Criação de barreiras econômicas semelhantes ao período da guerra fria, afastando a Rússia da economia neoliberal globalizada. Esqueceram que a Rússia lidera a CEI (Comunidade dos Estados Independentes, com 15 países, inclusive a Ucrânia;

3º Criar as condições para que Rússia e China se unam e se fortaleçam em uma Aliança Sem Limites, além de fortalecer o BRICS, a CEI e outros acordos e ações da Rússia no Oriente Médio, América Latina e outras regiões, diferente do momento em que os russos integravam a URSS. Agora a Rússia tem parceiros em todo o mundo e em algum momento irão precisar dos russos e isso gera um verdadeiro cabo de guerra;

4º Provocar situações golpistas na Ucrânia, favorecendo os russos para  a anexação da Criméia a Rússia e fortalecimento dos movimentos separatistas pró-russos. por mais que os conflitos provoquem perdas e estragos, como a Rússia é a segunda maior potência bélica e militar do mundo, uma guerra prolongada desestabilizará do o mundo; 

5º Encurralar os russos ao extremo. Sun Tzu, no século IV a.C. no livro a Arte da Guerra já alertava: "Nunca deixe seu inimigo sem saídas". Essa situação poderá fazer com que os russos arrastem todo o mundo para um conflito global, total incerteza sobre quem sairá vitorioso de um conflito mundial;

6º Achar que as sanções e os embargos econômicos afetarão a Rússia ao ponto de ela ceder em suas posições geoestratégicas, pois essas sanções contra uma potência, aliada de outra, poderá ser um tiro no pé, ampliando ainda mais a crise econômica do capitalismo global;

7º Criar uma atmosfera de Guerra Fria, para um mundo multilateral, neoliberal globalizado. Um mundo em que as disputas estão em todas as esferas da vida humana, como disse Milton Santos, em um meio técnico-científico-informacional, com pelo menos dez grandes potências dominando partes desse processo e a Rússia é um destes países. Atacar a economia russa é um tiro no pé de economias europeias e até mesmo americana e mundiais.

Uma simples aula de geopolítica sobre essa situação, demonstrará que russos e ucranianos são irmãos eslavos, mas os ucranianos aceitaram o desenvolvimento de um golpe em 2014, patrocinado pelos Estados Unidos e aliados. Faz quase uma década que a Otan pressiona a Ucrânia a abandonar a Rússia. Ou seja, se a OTAN se instalar na Ucrânia, com certeza, será uma tragédia anunciada muito pior e, por aí você começa a entender que a Otan deixou os russos sem saída e sem diálogos com o mundo. E estão fazendo exatos 30 anos em que, Iugoslávia, Polônia, Bulgária, Eslováquia, Eslovênia, todos países eslavos, ou seja, irmãos da Ucrânia e da Rússia, entraram nessa conversa da OTAN. Agora, devem perceber que podem ter feito um mal negócio pois viram reféns dos interesses  das potências militares do período da guerra fria.

Todos esses países, que eram membros da EX-URSS estão envolvidos com os interesses da Otan atualmente, aumentando as tensões e a desconfiança de todos. Os estudos geográficos indicam diferentes manobras midiáticas, enquanto a OTAN, Estados Unidos, Reino Unido, França e outros fazem dezenas de guerras no mundo, mas como são contra países pobres da África ou do Oriente Médio, tudo é abafado pela grande mídia. Só no Afeganistão, passaram 20 anos e a situação do pais ao invés de melhorar, piorou ainda mais.

A Ucrânia é vítima sim, mas não apenas da Rússia, melhor dizendo, aceitou essa situação desde 2014, quando deixou que um golpe político fosse praticado dentro do seu território, quando grupos neonazistas e neofascistas ou extremistas de direita incendiaram Kiev e criaram um governo golpista, depois elegeram um comediante ou humorista da TV local para presidente, que desde então, passou a flertar com a OTAN e a atacar grupos separatistas de minorias russas no leste do país, com mais de 3 mil mortes nestes últimos 8 anos de conflitos que já estavam em curso no país.

Os americanos, ingleses, franceses, italianos e alemães colocaram a Ucrânia nessa situação, poderiam fazer algo mais concreto, que apenas promessas vazias. Não querem mandar tropas, apenas armas. Por quê? A estratégia da OTAN é exatamente essa, vê os russos e ucranianos se matando e se destruindo, como aconteceu na Iugoslávia (destruída e dividida em oito países), pois só assim eles conseguem cumprir seus objetivos na região.

A OTAN liderada pelos norte-americano levou a Europa para uma guerra, assim, “cutucou o URSO (Rússia) coma vara curta”. Será que vão aguentar as consequências desse conflito? Enquanto isso, para onde caminha a humanidade? Onde estão as massas exploradas cotidianamente, com grandes oligopólios e monopólios capitalistas explorando as riquezas do planeta, com o suor do proletariado internacional?

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Professor Belarmino Mariano é doutor em Sociologia, Mestre em Meio Ambiente, Especialista em Geografia Territorial e Licenciado em Geografia. Professor de Geografia Política, Geopolítica e Teoria da Geografia pela UEPB.

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