terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Geopolítica: A disputa territorial entre Venezuela e Guiana

Essequibo, área disputada entre Venezuela e Guiana. Fonte: TeleSUR.
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          O Essequibo é uma área compreendida entre o Rio Essequibo e a divisa tradicional entre Guiana e Venezuela. Dispõe de uma série de recursos naturais, como ouro, bauxita, urânio, potencial hidrelétrico e, em seu oceano próximo, petróleo.
A disputa na região remonta ainda ao século XIX, quando os ingleses compraram as terras do Essequibo, que até então estavam sob domínio holandês, estabelecendo a Guiana Inglesa, em conjunto com as colônias vizinhas de Berbice e Demarara.

Origem da disputa

Estando sob controle do território, a Coroa Britânica contratou o naturalista Robert Schomburgk para realizar expedições pela área com o intuito de estabelecer as fronteiras da nova colônia. Destas expedições, resultou a Linha Schomburgk. Porém, tal demarcação foi muito contestada, tanto pelo Brasil, quanto pela Venezuela.
No caso brasileiro, ela foi resolvida ainda no início do século XX por Joaquim Nabuco e ficou conhecida como Questão do Pirara. Da área reclamada, cerca de 59% (19.630 km²) ficou sob domínio inglês/guianense, enquanto o Brasil ficou com apenas 41% (13.570 km²), perdendo o acesso à Bacia do Essequibo.
Questão do Pirara. Por Shadowxfox.
Já para a Venezuela, era arbitrária a colocada da região a oeste do Essequibo como território inglês. Para eles, a região foi originalmente ocupada por missões espanholas, sendo venezuelana por direito.
Os EUA, pautados na Doutrina Monroe (“a América para os americanos”) e repudiando a intromissão europeia em questões do continente americano, passou a apoiar a Venezuela, convocando um tribunal arbitral para solucionar o conflito.
Para a viabilização do tribunal, que se reuniu durante dois anos e meio em Paris, foram indicados cinco juristas, dois americanos, sendo um indicado pela Venezuela e outro indicado pelos EUA, dois ingleses e um russo, indicado por ambas as partes, que daria o voto de minerva caso necessário.
As negociações geraram o Laudo de Paris, que definiram que a maior parte da área reclamada (entre os rios Essequibo e Cuyuni) ficaria sob domínio inglês, enquanto uma porção a oeste do rio Cuyuni, antes reivindicada pelos ingleses, passaria para a tutela venezuelana.
Esta configuração do território permaneceu assim por cerca de sessenta anos.

A contestação venezuelana e a independência da Guiana

Em meados de 1962, durante o governo de Rómulo Betancourt, a Venezuela passou a contestar a decisão do Laudo de Paris.
Dentre os motivos que trouxeram o assunto a tona novamente, podemos citar o surgimento de suspeitas de um coluio entre o diplomata russo responsável pelo voto de minerva, Frederic de Martens, que fez seu doutorado na Universidade de Cambridge (Inglaterra), e os dois jurados ingleses.
Além do mais, se passou a questionar o porquê de, enquanto a Inglaterra ter dois jurados com nacionalidade inglesa, a Venezuela foi representada por americanos, sendo apenas um deles nomeado por Caracas.
Venezuelanos reconhecem Essequibo como “Zona en Reclamación”. Por The Photographer.
As potências ocidentais, como os EUA e até mesmo a Inglaterra, deram razão às ponderações venezuelanas. Este apoio se deve principalmente pelo fato de que, neste período, a Guiana Inglesa estava prestes a conseguir sua independência, com a ascensão de um governo marxista-leninista.
Em um contexto de Guerra Fria, onde os comunistas conquistavam o poder em Cuba, era temido pelas potências do mundo capitalista, especialmente pelos EUA, a formação de mais um Estado socialista nas Américas.
Assim, a Venezuela conseguiu a assinatura do Acordo de Genebra, que iria promover uma Comissão Mista para reabrir as negociações. Os venezuelanos passaram a considerar o Essequibo como parte do seu país nos mapas oficiais, mesmo esta região correspondendo a cerca de 2/3 da área total da recém independente Guiana.
Após algumas ações mais incisivas de ambos os lados, a partir de 1970 a Guiana acabou ficando em situação desfavorável para reivindicar uma quebra no acordo.
Isto se deve pois o Brasil, na época sob o regime militar, militarizou sua fronteira com a ex-colônia inglesa, agora sob comando de um governo esquerdista. Sendo impossível uma disputa em duas frentes por parte de Georgetown, o país recém independente buscou relações mais amistosas com os vizinhos venezuelanos, diminuindo a força de seu posicionamento em relação ao Essequibo.
Quando um governo de direita enfim chegou ao poder na Guiana, as tensões voltaram a existir. A Venezuela passou a agir diplomaticamente contra os guianenses, se opondo à construção de uma hidrelétrica no país e à contração de empréstimos por parte de Georgetown em órgãos financeiros supra-nacionais. A questão do Essequibo, neste período, passou a ser questão de segurança nacional para os dois países.
A partir da década de 1980, a disputa passou para égide da ONU. A partir daí, relações amistosas voltaram a ser estabelecidas. Guiana e Venezuela passaram a tomar medidas de cooperação, como ocorreu no caso da integração elétrica entre os dois países e na aliança militar contra o tráfico de drogas.
Tal cenário foi ainda reforçado no governo de Hugo Chavez, quando Caracas perdoou a dívida externa da Guiana para com os venezuelanos.

Quadro atual: Exxon Mobil e o governo Maduro

Diferentemente do que fez seu antecessor, Nicolás Maduro tem voltado a reivindicar o Essequibo como território venezuelano.
O principal motivo para isto foi a descoberta de petróleo no oceano localizado em águas guianenses por parte da multinacional americana Exxon Mobil.
Atualmente a Guiana importa todo seu petróleo dos vizinhos venezuelanos. A exploração das novas jazidas no país poderiam dar independência no produto a Georgetown, ao mesmo tempo que traria um novo concorrente para exploração petrolífera regional.
Além disso, alguns problemas ideológicos são bem evidentes. Maduro tem como principal adversário em escala global os EUA, e o crescimento da influência americana no país vizinho, por meio das suas multinacionais, pode atrapalhar o andamento de seu governo.
Fonte: 

Referências

NETO, Walter Antonio Desiderá. A questão fronteiriça entre Guiana e Venezuela e a integração regional na América do Sul. Conjuntura Austral, v. 3, n. 12, p. 11-25.

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