Por: Joana Belarmino*.
Sim. Cartola tinha razão. O mundo é esse triturador de coisas. Tal como ocorre no cosmos. No cosmos, estrelas se forjam e se destroem, assim como planetas, asteroides, quazares, e tudo o mais que não tem nome ainda. Só que no cosmos tudo acontece em câmera lenta, milhares, quiçá, milhões de anos, para uma estrela estertorar e morrer. No nosso mundo vivo, finito, as coisas destroem-se num pequeno lapso de tempo. Esbagaçamos uvas entre os dentes, derretemos chocolate por entre língua e céu da boca, onde a única possibilidade de estrela é a saliva corrosiva. Esbagaçamos amizades na frouxidão da desatenção fria, destruímos memórias queridas, numa espécie de boca do tempo escancarada e cheia de falhas dentárias. Cante alguma coisa; diga algo; você sequer verá a última sílaba do seu dito, repousada entre os lábios e a brisa, feito mariposa morta. Tá bom, então escreva. Ninguém vai ler você. Seu perfil cheio de likes, o imperativo da hora é dar likes. Olhe a sua postagem esmerada: Zero coments. Quando você partir, seus conhecidos olharão para o fogo da sua cremação, e quase com alívio, reproduzirão o repertório das coisas vividas com você. Pela última vez, acenderão o fogo da atenção para o que você foi, e sairão da casa de velórios aliviados, loucos para esquecer o tema da morte. O mundo há de sorver para o buraco negro do esquecimento, essa minha fala, essas minhas falhas, essas minhas frases toscas, regadas a tédio, nesse domingo calorento e silencioso. O mundo destruiu quase todos os acentos dessa minha escrita tola.
*Arte: Vant Vaz - Tribo Éthnos.
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