Assustador de crianças - Parte 1
Não faz muito tempo e as lembranças são variáveis. Uns até viam uma imagem de Jesus e outros me confundiam com o papa figo ou o velho do saco.
Uma boa lembrança foi quando era bolsista do CNPq, do projeto "Por uma Pedaço de Chão" coordenado por Emilia Moreira .
Fizemos um campo para a zona rural de Pedras de Fogo em uma combi velha da UFPB. Emília me orientou a amarrar os cabelos e colocar um boné, pra não assustar os agricultores. Éramos uns cinco a seis bolsistas e professores.
Entre as estradas de terra e os canaviais a gente ia planejando as abordagens com os camponeses e trabalhadores rurais das agrovilas locais.
Paramos a combi em uma determinada área para um registro fotográfico e explicações geográficas da professora. A questão agraria, o trabalho infantil e a saúde dos trabalhadores, entre outras temáticas, estimulava ao estudo.
Nesse meio tempo, apareceram uns cinco meninos, saindo do canavial com umas gaiolas de passarinhos nas mãos. Quando eu vi a cena, tirei o boné, soltei os cabelos, fiz gestos de ameaças com os braços e gritei: - O que vocês estão fazendo com esses passarinhos presos nessas gaiolas!!??!!?
Pense numa carreira danada desses meninos. Saíram em um derrape de velocidade que nem bala pegava. Foi inesperado e rimos muito com a encenação, mas Emília ficou preocupada demais com o que contariam aos seus pais.
Moral da história, quando chegamos na Agrovila Olho D'água, toda a comunidade já estava reunida, querendo saber quem eram aqueles malucos em uma combi velha, perdidos por dentro dos matos.
Aí Emília se apresentou, pediu desculpas pela brincadeira e conseguimos fazer um excelente levantamento sobre as condições de vida, trabalho e moradia daquelas família.
Foi nessa época que Emília, Takako Watanabe e Glaucia, entre outros pesquisadores e bolsistas, descubrimos e denunciamos o trabalho similar a escravidão, nos canaviais do Litoral Sul da Paraíba.
Quanto aos meninos, acredito que ainda hoje tenham um pingo de medo das minhas caretas de bicho papão.
Assustador de Crianças - Parte 2
Como expliquei anteriormente, de papa figo, velho do saco a maluco beleza, não faltava apelido para essa fase de minha vida.
Uma vez fui na casa onde me criei e fazia um bom tempo que não via os amigos de infância.
Na frente da casa dos meus pais, que moravam em Bayeux/PB, reencontrei um grande amigo apelidado por Didinho, que também já tinha se casado e dado um rumo na vida.
Naquela visita, aos familiares, encontrei o velho amigo em uma bicicleta e o filho de uns 3 anos na cadeirinha de ciclismo infantil. Me aproximei, dei um forte abraço no camarada e fiz carinhos na filho.
A criança radiante, olhava para meu rosto e espontânea como todas, expressou a seguinte frase: "- Papai do céu!". Risadas de todos e, enquanto a gente conversava sobre nossas travessuras de jovens, o menino continuava me observando em um transe de admiração sagrada.
Outra situação inusitada aconteceu no Rio de Janeiro. Quando fui a um encontro de geografia em Niterói/RJ, fiquei uns 15 dias hospedado na casa de meu irmão Raimundo Belarmino, que se localizava na Ilha do Governador. No preparativos para retornar, minha cunhada sugeriu que eu fosse ao frigorífico comprar umas carnes, que ela faria uma farofa e na viagem de ônibus pra João Pessoa, eu só gastaria com sucos.
Segui sua orientação e fui descendo o morro pra comprar as carnes. Do nada me aparece um moleque de uns 12 anos, segurando o pescoço de outro de uns 7 anos, lhe fazendo ameaças do tipo: "- Eu colocar o malandro pra lhe pegar!!! Pega ele malandro!!!".
Caramba, que susto da gota serena, quando olhei pra trás não vinha ninguém. Foi aí que comecei a compreender que nos ônibus, as pessoas me olhavam com uma certa assombração. Confesso que naqueles 15 dias no Rio de Janeiro, sempre andava desconfiado e até com um certo medo do desconhecido, mas só fui entender que assustava as pessoas pela malícia infantil de uma criança. Com minha mal assombrada aparência, no imaginário infantil carioca eu era um malandro (rsrsrs).
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