sábado, 9 de outubro de 2021

AVALIANDO A UEPB EM SEUS 34 ANOS DE ESTADUALIZAÇÃO

 

Fonte: Cartográfica temática de localização dos campus da UEPB. Site da UEPB/PROGRAD, 2021.


Belarmino Mariano Neto*

Ruth Brito de Figueiredo Melo **

José Claudiano de Brito Batista *** 

A década de 1980 foi marcada por muitas lutas e articulações políticas para que o Estado da Paraíba assumisse definitivamente o protagonismo de criar e manter o ensino superior através da estadualização de algumas fundações universitárias, transformando-as em Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Depois de ouvirmos representantes da UEPB, ex-estudantes, professores, técnicos e analisarmos relatórios da instituição, apresentamos de maneira sucinta, alguns fatos que marcaram a estadualização e autonomia financeira da UEPB ao longo dos últimos 55 anos e dos 34 anos de estadualização.

De acordo com arquivos da UEPB (Leis estaduais, resoluções e portarias), no dia 11 de outubro de 1987 o governador Tarcísio de Miranda Buriti, atendeu as reivindicações dos estudantes, professores e técnicos da antiga Universidade Regional do Nordeste (URNe), que havia sido criada pelo prefeito Williams Arruda de Campina Grande em 30 de abril de 1966 e que foi transformada na UEPB.

De 1966 até 1987 já eram 21 anos em que a URNe lutava por se manter viva, um dos períodos mais difíceis da vida política brasileira, em especial para a ciência e o ensino superior, pois o país vivia um longo período de regime autoritário com a Ditadura Militar (1964-1985) (PORFÍRIO, 2008).

De acordo com o depoimento de Waldir Porfirio, que na época da estadualização, era estudante de Psicologia e Presidente do Diretório Central dos Estudantes (DCE da URNe), ele relatou que não foi uma luta fácil, principalmente devido ao momento político autoritário que dominava o Brasil, mas com muita organização e habilidade política foi possível romper as amarras antidemocráticas para a estadualização da URNe e a criação da UEPB:

“- Na época da URNe havia uma grande evasão de estudantes, pois as famílias não conseguiam pagar as mensalidades dos filhos. Não existiam cursos noturnos nas universidades federais, pois a ditadura militar impedia o funcionamento de cursos a noite. Nossa luta começou primeiro pela redemocratização da universidade, pois o cargo de reitor era nomeado pelo prefeito de Campina Grande. Outro problema era a constante intervenção no Diretório Central dos Estudantes e as dificuldades para a organização dos Centros Acadêmicos. O Movimento Estudantil era obrigado a ser organizar na clandestinidade. Posso dizer que de 1982 a 1987, ocorreram muitas lutas até conseguirmos a Estadualização. Entre 1982 e 1983 tivemos que lutar contra a intervenção do DCE. Em1983 realizamos uma greve geral de 26 dias e daí para a frente, começamos a travar lutas pela democratização da URNe, e pela redução das mensalidades cobradas dos estudantes. Em 1984 ocupamos a sede da Reitoria e conquistamos uma redução de 30% das mensalidades. Enquanto pagávamos 70% a prefeitura de Campina e o Governo do Estado, complementava esses recursos para a URNe, mesmo assim, muitos estudantes não conseguiam pagar suas mensalidades, gerando uma alta inadimplência e evasão. Outra importante conquista com essa greve foi o direito de votar e escolher os diretores de centros, chefes de departamentos e coordenadores de cursos. Entre os anos de 1984 e 1985, a situação estava insustentável, o que levou os professores, liderados pela Associação dos Docentes da URNe (ADUERNe) e a Associação dos Servidores da URNe (AFURNe), a uma greve geral de quase seis meses, pois não recebiam seus salários. Nesse período, os estudantes também não queriam pagar suas mensalidades pois não estavam ocorrendo as aulas. Foi um período de muita tensão, de atos públicos, passeatas, plenárias de professores, técnicos e estudantes, reuniões do comando de greve com as autoridades locais e com o governo do estado” (Depoimento de Waldir Porfírio, Psicólogo, em 09/10/2021). 

Imaginem como era difícil manter uma universidade pública municipal em um município do interior do Nordeste e especificamente da Paraíba? Essa situação política do Brasil e de vários estados nacionais da América Latina que eram governados por militares, impediam a livre produção de conhecimentos e centralizavam o ensino superior na esfera federal, mas em Campina Grande, assim como em outros municípios da Paraíba, como Guarabira, pequenas fundações lutavam por manter minimamente cursos superiores para formação de professores e em outras áreas de conhecimento, inclusive com taxas que eram cobradas aos estudantes, impedindo a universalização do acesso as universidades. Waldir Porfírio continuou seu depoimento com memória de 1986: 

“- Em 1986 o DCE conseguiu realizar um debate com os candidatos a governadores da Paraíba que na época eram Marcondes Gadelha (PDS), Tarcísio de Miranda Buriti (MDB) e Carlos Alberto Dantas (PT) e todos se comprometeram que se fossem eleitos, realizariam a estadualização da URNe. Lembro que em 1985 foi um grupo de lideranças estudantis a São Paulo para o Seminário de Reforma Universitária, promovido pela UNE. O Ministro da Educação Marcos Maciel mandou uma comitiva do MEC para esse evento e nós colocamos uma grande faixa pedindo uma audiência sobre a longa paralisação e a crise da URNe. Depois que Marcos Maciel recebeu essa comitiva de estudantes, mandou uma comissão do MEC a Campina Grande e foram reunidos o prefeito, governo da paraíba, estudantes, professores e representantes da URNe. A condição para sair da Greve era o direito de eleger o reitor, reinvindicação que foi atendida. Dessa luta foi eleito o professor Sebastião Vieira, o primeiro reitor escolhido pelos seguimentos da comunidade universitária. Em 1986, foi assinado um acordo em que o governo estadual passou a fazer repasses de recursos, mais para isso, exigia a nomeação do reitor, a partir de uma lista, escolhida pela comunidade universitária. Nesse mesmo período começou a luta estudantil e a mobilização pela estadualização da URNe. Nós aproveitamos uma visita do governador Buriti em Campina Grande, para a abertura do semestre letivo em uma Aula Magna, em 15 de março de 1987, aí nós do DCE, juntamente com os vários centros acadêmicos, ocupamos o Auditório das Damas no centro de Campina, com cartazes, faixas e palavras de ordem pela Estadualização da URNe. Ao nosso lado também estavam os representantes dos professores e dos servidores técnicos. Na ocasião o governador se comprometeu em criar uma Comissão com representantes dos professores, técnicos, estudantes, da universidade e secretários do estado para o início dos trabalhos” (Depoimento de Waldir Porfírio, Psicólogo, em 09/10/2021). 

Depois que toda a UEPB se consolidou enquanto uma respeitada instituição estadual de ensino superior público, gratuito, inclusivo e de qualidade, talvez as novas gerações nem imaginem que foi preciso muita luta e sacrifício das gerações anteriores para esse reconhecimento da Universidade Estadual da Paraíba. Waldir Porfirio é uma memória viva e participativa desse processo de estadualização e conseguimos resgatar essa memória, quando ele nos disse: 

“- No mês de abril de 1987 foi instituída a Comissão de Estadualização, meu nome foi indicado como representante estudantil pelo DCE, prof. José Benjamim representando a ADURNe e o servidor Jesibel Lins representando a AFURNe, além dos representantes da URNe e dos secretários do estado. Lembro que todos os meses, em reuniões quinzenais, a gente se reunia para traçarmos os caminhos da estadualização e ainda hoje, guardo cópias de todas as atas desses encontros. Mas víamos que era um trabalho lento e não vacilamos na luta, então passamos a mobilizar os estudantes, com reuniões do Conselho de Base (COEB), em que ocorriam shows musicais e os debates nas nossas pautas. Na época o professor Rangel Junior era estudante de Psicologia e presidente do CA, como ele era cantor e vivia nesse meio artístico, sempre articulava com outros cantores locais para a realização de shows. Desses encontros a gente tirava encaminhamentos para a realização de atos públicos e passeatas, reivindicando a estadualização e o ensino público e gratuito. Até que, em 11 de outubro de 1987 a Estadualização foi oficialmente instituída. Mas o ensino público e gratuito, que era uma das nossas reivindicações não foi incluído na Lei de estadualização, então ainda éramos obrigados a pagar 70% de mensalidades, enquanto o governo garantia 30% e a realizações de repasses que eram insuficientes para a manutenção da UEPB. Não contamos história, partimos para o ataque, realizamos sete (7) reuniões do Conselho de Base, uma em cada centro, mobilizando os estudantes para que todos nos entregassem os carnês e ninguém pagasse mais mensalidades. Chegamos ameaçar que iriamos queimar todos os carnês na porta da Reitoria e o governo nos ameaçou dizendo que o DCE iria pagar as mensalidades. Lembro que nesse período, de 9 mil estudantes as matrículas caíram para uns 7 mil e diante das tensões e revoltas, o governo recebeu uma comissão dos representantes dos estudantes que na época tinha o estudante Tico Brasileiro como presidente do (DCE) e, em fevereiro de 1988, o governador nos recebeu, recuou e aprovou a gratuidade do ensino e o perdão das dívidas dos carnês (Depoimento de Waldir Porfírio, Psicólogo, em 09/10/2021). 

Perguntamos o que o líder estudantil e psicólogo formado pela URNe, que virou UEPB, sentia em dias atuais, vendo que sua luta e a luta dos seus contemporâneos frutificaram e criaram as condições para a UEPB ser reconhecida como uma das mais importantes universidades estaduais do Nordeste brasileiro: 

“- Foram tempos memoráveis e quando vou a URNe, digo a UEPB e vejo aquela monstruosa estrutura, todos aqueles prédios e todo o crescimento e transformação da UEPB, com cursos em todos os níveis, sinto que participei e contribui com essa luta. Hoje, quando vejo Francisco Brasileiro, como prefeito de Foz do Iguaçu por dois mandatos, quando vejo o camarada Antônio Rangel Jr que a época era do CA de Psicologia e do DCE, tendo sido um grande articulador da ADUEPB (sindicato dos professores), tendo sido eleito Reitor da UEPB por dois mandatos, isso sela uma história de muita luta, em que, as conquistas foram muito positivas para o desenvolvimento de Campina Grande e de toda a Paraíba. Toda essa luta me rendeu a escritura de um livro sobre os anos de luta: da intervenção do DCE a Estadualização da URNe (1981 a 1987). Em resumo em posso dizer que fizemos uma transformação radical de uma universidade municipal autoritária e paga, para uma universidade democrática, pública e gratuita” (Depoimento de Waldir Porfírio, Psicólogo, em 09/10/2021). 

Essa história ou relato de vida de um dos estudantes de psicologia da URNe, que esteve na vanguarda da estadualização, confirma que em 1987, passamos a ter a certidão de nascimento da UEPB que recebeu o “reconhecimento de paternidade pelo governo estadual”, através da Lei 4.977, que converteu a Universidade Regional do Nordeste em Universidade Estadual da Paraíba. A partir de então, novos caminhos foram abertos para a UEPB, apontando para sua lenta e gradual consolidação, pois as lutas continuaram em outras frentes. Nestas contas temos 34 anos de estadualização e 55 anos de existência da URNe até a UEPB. Com bem lembra o professor Andrade:

“- Dia 11 de Outubro nossa UEPB irá completar 34 anos de sua conquista histórica da ESTADUALIZACÃO. Nesse dia eu estava na grande solenidade de assinatura pelo governador Buriti. Naquele período lembro da atuação do DCE, SINTESP e da ADURNE. Eu era estudante de Sociologia da UFPB em Campina Grande. Professor Benjamim, Valdir Porfirio, Arnaldo Albuquerque e Rizonaldo eram líderes desse gigante processo de ampliação e consolidação do Ensino Superior Público” (Memórias do professor José Cristovão de Andrade, colhida das redes sociais, 2021). 

          Na época existiam duas grandes teses, grupos contrários a Estadualização da UEPB que afirmavam não fazia sentido algum, o governo do Estado investir no ensino superior, pois além de ser um Estado pobre, seu papel era garantir a Educação Básica. A pobreza desse argumento se chocava com o grande debate que envolvia o ensino superior ao processo de desenvolvimento regional em escala estadual.

Agora poderíamos perguntar aos negacionistas da década de 1980. Imaginem se o projeto de estadualização não tivesse vingado, como o município de Campina Grande, teria conseguido manter a URNe? Diante das profundas crises e da falta de recursos para um município manter uma Universidade, poderia ter destruído essa possibilidade de universidade, como vimos em relatos de fechamento da URNe por falta de recursos.

Outra importante questão é saber que, se a UEPB não existisse, como foi se consolidando ao longo desses últimos 34 aos de estadualização? Milhares de profissionais em diferentes áreas não teriam se graduado, em especial nas dezenas de cursos de licenciaturas, professores e professoras que se espalharam por todo o Estado da Paraíba e por estados circunvizinhos. Milhares de profissionais das áreas de tecnologias, engenharias, saneamento, química, saúde, comunicações, ciências humanas, sociais etc., não teriam se formado, deixando um vácuo e um atraso no desenvolvimento da Paraíba, do Nordeste e do Brasil.

O que seria da Educação Básica paraibana sem a Estadualização da UEPB? A UEPB é o melhor dos exemplos de interiorização do Ensino Superior na Paraíba, tanto a Estadualização em 1987, que agregou a antiga URNe (Campus I – Campina Grande), a Escola Agrícola Assis Chateaubriand (Campus II - Lagoa Seca), a Faculdade de Filosofia Ciências e Letras-FAFIG (Campus III – Guarabira) e depois a Escola Agrícola do Cajueiro (Campus IV – Catolé do Rocha), foram as primeiras unidades ou centros universitários incorporadas a UEPB e que, formaram milhares de professores e outros profissionais de diferentes áreas.

Outro importante protagonista do processo de estadualização da URNe foi o professor Antônio Rangel Jr, a época era estudante do curso de Psicologia. Sua trajetória é interessante pois ele cumpriu todas as etapas que um estudante poderá atingir dentro de uma universidade, pois foi estudante, professor, presidente do sindicato dos professores, assumiu diversos cargos administrativos ao longo das décadas pós estadualização e chegou a condição de reitor da UEPB por dois mandatos consecutivos. Sobre o processo de estadualização ele nos contou o seguinte:

"- Entrei na URNe em 1981 em meio a instabilidades e turbulências. A crise de financiamento e falta de representação e liderança deslegitimavam os reitores, que se sucediam a cada crise mais aguda. Foram uns 4 ou 5 reitores em 5 anos. Comecei a participar das greves em 1982 e 1983 por conta do violão. Sempre me chamavam para os atos públicos pra cantar algumas canções de protesto. Em 1984 meu envolvimento já era artístico e político. A campanha pelas "Diretas Já!" deixou em mim um saldo político enorme de aprendizado, frustração e revolta. Na esteira dessa luta o país inteiro agregou a bandeira das eleições Diretas nas universidades. De coordenação de curso a direção de centros e reitoria. Na URNe tinha o agravante da crise financeira e mensalidades altas, inadimplência, inflação, crédito educativo, etc. Em 1985 eu já era militante efetivo no ME. Presidente do Centro Acadêmico de Psicologia. Começamos uma luta pela federalização e foram muitos movimentos, reuniões, viagens, congressos de área e da UNE. A eleição de reitor e vice veio como desfecho de uma longa greve de docentes, a mais longa até então, e abriu caminho para um compromisso maior dos gestores com uma solução permanente ou mais duradoura. Em meio à luta pela federalização surge a tese e possibilidade real de estadualização, que se mostrou viável e uma espécie de salvação institucional. Embarcamos todos nela, enfrentamos algumas resistências internas e muitas externas em Campina Grande, pois muitos acreditavam que o "patrimônio de Campina seria doado ao governo do Estado." A vida mostrou que estávamos do lado certo da história" (Depoimento do prof. Antônio Rangel Jr. em 11/10/2021).

O depoimento do professor Rangel Jr nos coloca diretamente nos cenários imaginários de uma década muito conturbada e, quem tem uma certa idade, sente o furor das ruas e avenidas do país em meio aos movimentos sociais que lutavam por democracia, que lutavam por direitos políticos de fato. Os movimentos contra a carestia e a volta do "irmão do Henfil",  "Caminhando e cantando", "Prepare o seu coração pras coisas que eu contar", entre tantas outras canções que ecoavam nas avenidas, pedindo "diretas já" e lutando contra a carestia e por uma constituinte que acelerasse o fim da Ditadura Militar. A juventude estudantil assumiu esse protagonismo e com apoio de muitos professores e técnicos administrativos, conquistaram o mais importante momento para o futuro de uma Universidade que se queria, democrática, pública e gratuita.

Entre muitos outros protagonistas que estiveram na ponta de lança desses conquistas, tivemos o privilégio de ouvir a opinião do professor e historiador Benjamim Pereira, que a época da estadualização era o presidente da ADEURNe e foi ativo nesse processo de luta pela estadualização da URNe, que se transformou em UEPB:

"- Sobre a e s t a d u a l i z a ç ã o, em abril de 1987 o Professor Benjamim (Presidente da Adurne) reivindica ao governador da Paraíba (Tarcísio Burity) a Estadualização da URNe na presença do reitor (Sebastião Vieira) e dos Presidentes do DCE e da Afurne (Valdir Porfírio e Josibel Lins) e jornalistas. Após debate ocorrido no auditório do Colégio das Damas. Em consequência o governador criou a Cesefurne - Comissão de Estudos para Estadualização da Afurne e, em 11 de outubro, após conclusão do intenso trabalho da comissão, que ouviu a comunidade universitária (Professores, Estudantes e Funcionários) e a comunidade de Campina (através das entidades de classe, sindicatos, câmara de vereadores, Sab's e igrejas) sobre o modelo de universidade que deveria ser criada, foi assinada, no Parque do Povo, a Lei que criou a UEPB uma Universidade para Todos os paraibanos. Contado assim parece que foi um passeio, na verdade o processo de Conquista Democrática da Estadualização demandou muita Luta, suor (e até lágrimas . . .). No meio do caminho tinha muitas pedras, contra a Universidade Pública, Popular, Democrática e Gratuita, (e a sede em Campina), entre as tais pedras, havia uma tal Fugama . . . não, não foi um passeio, exigiu luta renhida! A  U E P B é uma Conquista da Democracia! (para Todos os paraibanos)" (Depoimento do Professor Benjamim Pereira, presidente da ADURNe em 1987.  Em10/10/2021).

A liderança sindical do que viria a se tornar a Associação dos Docentes da UEPB (ADUEPB), também conhecido como Sindicato dos Professores da UEPB, deixou registrado em sua memória e em seus arquivos de historiador, importantes fragmentos dos fatos, mas também sentimos em sua fala e em sua memória, sentimentos e emoções de um passado, não tão distante, mas que ainda está borbulhando em sua existência humana, confessamos a nossa própria emoção em estarmos fazendo parte dessa história, mesmo que neófitos na arte de aprender a ouvir e observar os mais experientes e aqui nos referimos as experiências vividas na própria pele, pois ressalta-se a ideia de que não foi um passeio, não foi fácil e provavelmente, conseguimos ver os negacionistas a espreita, apostando nos erros, nas falhas e no desfecho desastroso para a utopia ativa dos que lutavam por democracia, educação superior pública e gratuita para todos e todas.

Arquivo do Prof. Benjamim Pereira, Sentados: Tarcísio Burity, Sebastião Vieira,
Benjamim Pereira e Josibel Lins. Março de 1987.
Na década de 1990, diante das diferentes crises econômicas, mesmo estadualizada, a UEPB vivia no sufoco, pois não possuía orçamento próprio e nem conseguia avançar em outras áreas e níveis que eram exigidos para a consolidação da universidade em termos do Ensino, Pesquisa e Extensão, além dos programas de pós-graduação, tanto o lato sensu, quanto stricto sensu. Os que viveram a década de 1990, consideram anos difíceis, pois apesar da estadualização, os recursos da UEPB eram insuficientes para os avanços necessários, uma década de crise econômica e superinflação, que corroíam os salários e impediam as melhorias da instituição. Foi uma década de muitas lutas, entre elas greves históricas em defesa do ensino público, gratuito e de qualidade.

Depois da Estadualização da UEPB, a situação orçamentária da instituição, dependia da boa vontade dos governos de plantão e os investimentos na UEPB eram inferiores as suas necessidades de crescimento, ampliação e consolidação. Nesta luta por conquistas e fortalecimento da UEPB, sempre estiveram na linha de frente o Sindicato dos Servidores Docentes (ADUEPB), o Sindicato dos Servidores Técnicos (SINTESPB/UEPB), DCE e dezenas de centros acadêmicos.

Ao final da década de 1990 e início do século XXI, a universidade enfrentava forte crise e até greve de fome foi feita, além da ocupação da Assembleia Legislativa, por professores, estudantes e técnicos, pressionavam o governo para que atendesse as reivindicações da comunidade universitária. A falta de programas para consolidar o ensino superior em seus diferentes níveis e os limites orçamentários da instituição, impedia que a UEPB ascendesse ao patamar de Universidade Plena.

Diante de todas estas dificuldades só existia uma saída, continuar lutando pela Autonomia da UEPB. Greve, pressão, manifestações e articulação política, movimento sindical docente, técnico e estudantil foram o tripé para que a voz dos que faziam a UEPB ecoasse na sociedade e nas forças políticas estaduais, até que, em 06 de agosto de 2004, foi sancionada a Lei N° 7.643 (Autonomia financeira da UEPB).

Com a Lei de autonomia financeira, a UEPB se tornou referência de autonomia para dezenas de universidades estaduais no Nordeste e no Brasil e com a autonomia foi possível a realização de concursos para professores e técnicos, o estabelecimento de planos de requalificação dos docentes e técnicos e o mais sonhado, os primeiros passos para a ampliação dos programas de pós-graduação e para o incentivo aos Programas de Iniciação Cientifica e de Extensão.

A partir de 2006, a UEPB finalmente ascendeu para a construção do ensino superior em nível estadual, com significativa expansão territorial dentro do Estado, com a abertura de campus e novos cursos, aos exemplos do Campus em João Pessoa; Patos; Monteiro e Araruna, além da assinatura de dezenas de convênios para programas especiais, entre os quais, programas de Especialização, mestrados, doutorados e cursos de formação de pedagogos em serviço e cursos de graduação em formato a distância (EaD).

          Sem dúvidas, a UEPB estadualizada, foi fundamental para o Desenvolvimento, tanto educacional, quanto tecnológico e socioeconômico em diferentes escalas, pois depois da estadualização, outras lutas, projetos e sonhos foram traçados pelas diferentes categorias e estudantes da UEPB. Nos dias atuais a UEPB já conta com mais de 18 mil estudantes, em 08 campus e em 12 centros universitários, além de dezenas de polos de EAD e formação de professores que já estão em serviço.

Na atualidade, a UEPB já conta com 23 programas de mestrados e doutorados, além de 19 programas de especializações e esse avanço só foi possível graças a luta pela estadualização e autonomia, que alavancaram as bases para o desenvolvimento do ensino superior em todos os níveis. Também pedimos a opinião de discentes na atualidade e ouvimos do Estudante Roberto Borges, matriculado em Geografia no Campus III da UEPB, sobre o que ele acha da UEPB em sua formação e ele nos respondeu assim: 

“- Sou de Alagoinha e estudante da UEPB em Guarabira. Desde que entrei no curso de Geografia, me interessei pelo Movimento Estudantil, entrei no Centro Acadêmico (CA), depois me envolvi com o Diretório Central dos Estudantes (DCE), movimentos estes, que me fizeram crescer pessoalmente e politicamente. Lutei por melhorias para os estudantes, bem como para o campus III. A UEPB ainda tem muitas demandas reprimidas, mas sem a UEPB, eu, assim como muitos paraibanos não teriam a oportunidade de realizar o sonho de um curso superior, nem uma pós-graduação. Por isso que, para além da estadualização e autonomia, o governo precisa investir muito mais, pois ainda temos muitos jovens e adultos que desejam entrar na UEPB e ainda encontram muitos obstáculos” (Opinião de Roberto Borges, CAGEO, 09/10/2021). 

          Hoje a UEPB se encontra em 08 municípios das diferentes regiões da paraíba, além de ter 05 centros em Campina Grande; polos educacionais superiores em vários outros municípios em convênio com a Universidade Aberta do Brasil (UAB); programas de mestrados profissionais em parceria com outras universidades do país e da região Nordeste. Ao ouvirmos o servidor Amarildo Henriques que foi estudante de História da antiga FAFIG em Guarabira e que se tornou técnico administrativo da UEPB, militante estudantil e sindical, nos disse o seguinte:

“- Já tenho mais 40 anos de vida na UEPB, desde a antiga FAFIG e de sua inclusão no processo de estadualização da URNe e da Escola agrícola de Lagoa Seca. Eu posso dizer que a luta pela estadualização e criação da UEPB foi fundamental para a ampliação do ensino superior em todo o Estado, pois nem todos podiam pagar mensalidades para fazer um Curso Superior. Eu fui estudante de História e entrei muito cedo na Universidade, na condição de Técnico Administrativo. Participei tanto das lutas estudantis, através do Centro Acadêmico e do DCE, quanto do sindicato dos técnicos administrativos, através da Seção Guarabira do SINTESPB/UEPB. Antes da estadualização a situação da universidade era difícil, pois havia muitos estudantes inadimplentes e muita evasão, e o município, nem sempre conseguia manter os salários dos servidores técnicos e professores em dia. Diante das crises e mesmo em meio ao período ditatorial vivido no Brasil, a gente se mobilizava e fazia as nossas lutas, até que conseguimos incluir a antiga FAFIG no processo de Estadualização que ocorreu em 1987. Depois de 34 anos de lutas, podemos concluir que nos primeiros anos, tudo foi muito difícil e com a autonomia universitária que ocorreu em 2004, a UEPB avançou bastante, mas ainda temos muitas conquistas pela frente” (Depoimento de Amarildo Henrique de Lucena, Campus III, SINTESPB/CH/UEPB, 09/10/2021).

          Ao ouvirmos todas estas experiencias de vida, nos surpreendemos com depoimentos tão ricos, pois pedimos um pequeno comentário sobre o processo de estadualização e vimos que, mesmo, depois de tanto tempo, para aqueles que estiveram na linha de frente das lutas pela estadualização, as ideias e memórias ainda estão muito claras nas mentes de quem viveu essas experiências.

          Não podemos negar que estes quase dois últimos anos de pandemia do Covid-19, colocaram a UEPB em uma nova realidade educacional, tendo que se reinventar para em plena pandemia, criar as condições para o funcionamento remoto, através das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC´s), fomentando a aquisição de sistemas tecnológicos e treinamento docente, técnico e discente para o acesso as tecnologias remotas, além de programas especiais de conectividade para os estudantes de baixa renda. Ouvindo a Magnifica Reitora, professora Célia Regina, em que lhes perguntamos como ela avalia a importância da estadualização da UEPB e quais são os desafios para essa década de 2020? 

A Estadualização da Universidade Estadual da Paraíba representa uma conquista, resultado de uma articulada mobilização acadêmica, em que muitas pessoas estiveram firmes na defesa de uma universidade pública, gratuita e de qualidade. O nosso desafio é de prosseguirmos nesta caminhada, inspiradas nessa trajetória de resistência e superação, construindo uma Instituição cada vez mais relevante para o desenvolvimento científico, tecnológico, social e cultural do Estado da Paraíba, do Nordeste e do Brasil (Opinião da professora Célia Regina, Reitora da UEPB, 09/10/2021). 

          Apesar das dificuldades em desenvolvermos o trabalho remoto, em sistema sincrônico e assincrônico, a UEPB vem mantendo suas atividades nos mais diferentes níveis de serviços ao público e o atual momento é de análise e reflexão sobre a melhor e mais segura maneira de retornarmos as atividades presenciais a partir de 2022. Mas esse é um debate que ainda precisa ser amadurecido, pois o mais importante é a saúde e a vida de todos/as envolvidos/as no processo de ensino aprendizagem e atendimento técnico a comunidade da UEPB e aos paraibanos.

Para concluímos essa avaliação, queremos destacar que no dia 08 de outubro, há exatos dois dias do registro de estadualização da UEPB, tivemos a felicidade de recebermos o governo do Estado da Paraíba, para selar mais investimentos na área de educação, ciência e tecnologia, em parceria com a UEPB, como destacou a Magnifica Reitora Célia Regina, que em nome da UEPB ressaltou o significado desse ato governamental, pois o governador fez a assinatura de convênio com a UEPB, no valor de R$9,5 milhões e o lançamento do edital no valor de R$ 5 milhões.

_____________.

* Doutor em Sociologia (UFPB/UFCG), Mestre em Meio Ambienta (UFPB/UEPB). Professor do Departamento de Geografia do CH, Campus III. Coordenador da Comissão Permanente de Avaliação (CPA)

** Doutora em Engenharia de processos (UFCG), Mestre em Ensino de Ciências (UEPB). Professora do Departamento de Licenciatura em Física do CCT, Campus I. Coordenadora adjunta da Comissão Permanente de Avaliação (CPA).

*** Mestrado em Desenvolvimento Regional (PPGDR-UEPB). Especialista em Direito Administrativo e Gestão Pública (UNIFIP). Bacharel em Administração (UEPB). Assistente administrativo - coordenação de administração, campus VII, Patos. Secretário da Comissão Própria de Avaliação (CPA/UEPB).

Dados obtidos através do Relatório de Atividades 2020, organizado pela Pró-Reitoria de Planejamento e Orçamento – PROPLAN (Pollyanna Xavier Nunes França Ivan Barbosa dos Santos, 2020). Entrevistas pontuais com representantes da instituição, estudantes, técnicos, professores e ex-estudantes.

PORFÍRIO, Waldir. Anos de Luta - Da intervenção no DCE da URNe a estadualização da Universidade - 1981 a 1987. Campina Grande: Eduepb, 2008.

8 comentários:

  1. Parabéns profs Belarmino e Claudiano e profs Ruth por este resgate merecido e desconhecido do público em geral.
    Parabéns à UEPB, à sua comunidade estudantil e ao povo paraibano portão grande feito, por tamanha conquista, uma universidade pública, gratuita e de qualidade que se fortalece a cada dia.
    Tenho orgulho de ter sido aluna da UEPB e hoje professora dessa instituição, espaço que me acolheu como estudante e como profissional.
    Parabéns UEPB!!!!

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  2. História de luta mais que trouxe muitas conquistas e graças a ela tenho hoje a oportunidade de fazer parte da UEPB

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  3. As memórias das lutas, construções e resistências dessa instituição que contribui para aprendizagem e emancipação de tantos. Parabens!

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