Eu recebi, nesse fim de ano, muitas palavras de louvação a Deus. Muitos pedidos de aceitação de Cristo. Escutei a maior parte dessas mensagens com paciência, com a certeza de que os amigos estavam sendo sinceros. Meus amigos querem me salvar. Mas... Salvar-me do quê? De quem? Não tive coragem de replicá-los. Seria indelicado da minha parte. Seria grosseiro, dissuadí-los da sua nobre missão de "acordar minha alma". Por isso escrevo aqui, no meu perfil, onde ainda sou dona e senhora das minhas palavras. Eu não falo com Deus! Eu não cubro minhas pretenções de falar com Deus, com frases e frases de salvação. Eu penso em Deus como uma força tão indizível, tão ao mesmo tempo grandiosa e ínfima, eu penso em Deus com uma força tão sem nome, tão sem substantivos, tão sem essa gramática normativa, que as palavras não fazem sentido aqui. Eu não sei o que haverá depois que eu partir. Eu só penso que devo regressar ao ponto de fusão, ali onde se criam estrelas e vermes; ali onde se inventam planetas e pensamentos, ali onde a cozinha cósmica é puro artesanato de invenções sem nome. Não, eu não falo com Deus, e sei que nem eu nem ninguém precisa se salvar. O meu Deus não tem nome. O meu Deus é a vida, cumprindo-se, em toda a sua plenitude. As angústias, os sofrimentos, são todos nossos! A vida é essa overdose de surpresas, de "não acredito", que muitas verzes a gente cobre com nossa inércia, nossa ignorância, nossa crueldade. Se eu quiser dar um nome à minha divindade, ela se chamará espanto; ela se chamará invenção; ela se chamará ruído cósmico, com todas as suas coisas estranhas. Meu deus é estranho, mas eu confio na sua força!"
Artigos políticos, culturais, socioeconômicos e ambientais; críticas, denúncias e analises conjunturais.
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