(Guardião da Paz na praça das Nações Unidas em Nova York. Foto: Twitter/Missão da ONU no México).
Por Affonso Romero e Angelo Cedraz.
Hoje eu li uma postagem - até simpática a Lula - dizendo que era forçação de barra compara-lo a grandes líderes como Gandhi, Mandela e Luther King.
Tenho que concordar que são fenômenos bem distintos.
Gandhi era filho do Primeiro Ministro de um pequeno Estado-títere na Índia Britânica. Mandela veio da realeza Zulu. Luther King era filho de um proeminente pastor batista. Os três tiveram berço.
Lula veio de uma posição muito mais difícil, de uma família de lavradores do sertão, foi abandonado pelo pai, migrou forçadamente, conheceu a fome e a miséria que os demais jamais experimentaram na carne. Lula teve um caminho muito mais longo a percorrer.
Gandhi e Mandela foram enviados à Inglaterra para estudarem, tiveram recursos e boa formação, tornaram-se advogados. King foi enviado ao seminário e formou-se pastor, como o pai. Os três foram preparados para liderar.
Lula mal teve acesso à formação escolar básica, teve que trabalhar desde a infância e procurou por uma formação técnica depois de adulto. Lula teve muito menos oportunidades e incentivos acadêmicos muito menores e deve seu sucesso, exclusivamente, à sua capacidade de superação pessoal, à inteligência instintiva e ao esforço próprio.
Apesar disso - ao talvez por isso - Lula tem mais títulos e homenagens acadêmicas que os demais somados.
A luta de Gandhi era, basicamente, pela soberania da Índia frente ao domínio britânico. Posteriormente, foi responsável pelas bases de fundação do moderno Estado indiano. Seu diferencial foi pregar a não-violência. A luta de Mandela era, basicamente, contra o racismo e sua forma de política oficial do Estado, o apartheid. A luta de Luther King era, basicamente, contra o racismo, Só nos últimos anos de sua vida acrescentou pautas como o combate contra a pobreza, contra a Guerra do Vietnã e a favor de direitos civis.
Enquanto os demais se mantiveram alinhados a pautas específicas e que lhes diziam respeito diretamente - basicamente movidos por razões étnicas e religiosas - Lula trabalhou a favor da soberania nacional (como Gandhi), contra o racismo (como Mandela e King), a favor de direitos civis (como King), e foi além, abraçando pautas como trabalho, moradia, comércio internacional, diplomacia. unidade regional, educação, combate à fome e mobilidade social.
Dos quatro, apenas Mandela, além de Lula, teve sobre os ombros a responsabilidade de um cargo eletivo, de representar um Estado, de liderar politicamente uma grande Nação. Enquanto Mandela fez um governo de reestruturação e reconciliação nacional, com resultados sociais e econômicos medianos, Lula é considerado globalmente um fenômeno de gestão da inserção social, de desenvolvimento nacional em meio a uma crise global e de liderança regional.
Gandhi, Mandela e Luther King conseguiram resultados e libertação para seus guetos étnicos, no âmbito local. Sua influência global é espiritual. São exemplos aos demais povos e, dessa forma, contribuíram - e ainda contribuem - para um mundo melhor.
Lula conseguiu resultados objetivos para gente da mais variada origem, seja étnica, regional, cultural ou religiosa, extrapolando o conceito de gueto. Não bastante, durante seu governo o Brasil exportou programas sociais (como o Bolsa Família) para uma centena de outros países, levando inspiração e resultados objetivos para todos os continentes e salvando um número maior de vidas.
Quando for comparar Lula a Gandhi, Mandela e Luther King, lembre-se de que eles têm em comum o fato de terem lutado de forma pacífica por justiça, igualdade e um conjunto de valores que os coloca no panteão dos grandes benfeitores da humanidade. E que, exatamente por isso, todos os quatro foram perseguidos pelo Estado e pelas elites de suas respectivas sociedades, sofreram lawfare, tiveram contra si processos judiciais artificiais que tentaram dar ares de legalidade a uma perseguição fundamentalmente política, sofreram preconceito, foram presos, tiveram contra si a imprensa e sofreram atentados contra suas vidas.
Mas lembre-se, também, que Lula partiu de uma posição muito mais difícil, teve uma travessia muito mais atribulada, menos formação e oportunidades, sofreu injustiças desde antes de encarar a sua luta política, tratou de temas muito mais abrangentes e diversificados, teve uma liderança global muito maior e operou mudanças diretas na vida de um número muito maior de pessoas.
Há alguns traços comuns na história dos quatro, mas Lula é infinitamente maior que os demais, exceto pelo fato de não ter nascido num país anglofônico.
(Affonso Romero) (Angelo Cedraz)