Esse tema deve ter pego a juventude do ENEM de surpresa e muitos devem ter ficado de cabelo em pé. Pois é tema muito relacionado com a invisibilidade e capacitismo das pessoas idosas, com a ideia de inatividade e inutilidade da pessoas depois que atingem a velhice.
Lembrei muito de Zeca Pagodinho e o repertório da música popular como: "deixa a vida me levar, vida leva eu", ou do "velho da lancha, o cabeça branca". Nesse ponto, até parece que envelhecemos da mesma maneira e nas mesmas condições.
Essa meninada acostumada com modelos prontos e repertórios coringas, devem estar putos com os organizadores dos temas da redação do ENEM, pois o universo temático é tão vasto, que nunca esperam um tema realista e tão próximo da sua condição social.
Certamente, muitos nem lembraram dos seus próprios familiares e das contradições e dificuldades em envelhecer no Brasil. Talvez nem tenham se lembrado das políticas previdenciárias que foram atacadas pelos governos neoliberais, ao exemplo do golpista Temer/Bolsonaro, destruindo o direito de aposentadoria, congelando salários e fraudando o INSS, com descontos indevidos em milhões de aposentadorias, através de entidades corruptas e facilitação de agentes públicos.
Não é fácil envelhecer no Brasil, pois milhões de brasileiros vivem entre o desemprego e a informalidade, a baixa renda e a falta de contribuição previdenciária. Muitos brasileiros até se aposentam, mas os baixos salários geram uma baixa aposentadoria, obrigando os idosos a continuarem a trabalhar para completar suas rendas, pois não dá para viver com dignidade.
No Brasil até existe um Estatuto do Idoso, com direitos e garantias mínimas a dignidade humana para as pessoas com mais de 60 anos. Mas existe uma gigantesca distância entre o que está no papel e a realidade.
Os idosos pobres e periféricos, grande maioria social, em grande parte, são responsáveis por significativa parcela do orçamento doméstico das famílias. Em muitos casos, a aposentadoria é para todos, menos para os próprios idosos.
Com a velhice, se acumulam os problemas de saúde, as comorbidades e a exigência de uma nutrição especial, mas em muitos casos, as aposentadorias mal suprem a compra dos medicamentos e alimentação adequada.
Enquanto o velho da lancha "pode deixar a vida levá-lo", pode bancar tudo, milhões de brasileiros idosos e pobres, são obrigados a trabalhar informalmente, pois nem conseguiram se aposentar. Envelhecer com dignidade e bem-estar social no Brasil não é uma tarefa fácil.
Até parece que todo mundo consegue levar uma vida fácil e envelhecer de maneira plena, mas, apesar dos dados demográficos do IBGE, apontarem um crescimento estatístico da população acima dos 60 anos, faltam muitas políticas públicas voltadas para esse segmento.
Os entes federativos, em especial os municípios e as cidades, não estão preparados para atender as necessidades fundamentais de sua população envelhecida. Então a estratégia é maquiar a realidade, enquanto os idosos são invisibilizados com a maior naturalidade.
As vezes a placa de estacionamento para idoso, as rampas de acesso e as escadas com corrimão, escondem que a grande maioria dos idosos, não tem carros e nem acesso a cidade. Imagina, quantos cabeças brancas possuem lanchas, num país em que "ser velho" é um grande problema, em especial para os governos neoliberais?
Por Belarmino Mariano. Imagem prova do ENEM, 2025.